Urnas eletr�nicas garantem elei��es limpas h� mais de 20 anos
Para o cientista pol�tico Carlos Ranulfo e o coordenador do MP Eleitoral de Minas, Edson de Resende, a desconfian�a em rela��o � vota��o atual n�o faz sentido
Uma nova era come�a em 1996: t�cnicos do TRE-MG ensinam moradores de vilas de BH como votar para prefeito e vereador na urna eletr�nica (foto: JORGE GONTIJO/EM/D.A PRESS - 27/6/96)
Implantadas no Brasil na segunda metade da d�cada de 1990, as urnas eletr�nicas t�m sido alvo de cr�ticas do presidente Jair Bolsonaro e de parte de seus apoiadores nos �ltimos anos. No encerramento da s�rie de reportagens sobre o voto em papel, o Estado de Minas discute o cen�rio em que os ataques ao atual sistema eleitoral se proliferaram.
Para Carlos Ranulfo, professor titular apo- sentado do Departamento de Ci�ncia Pol�tica da UFMG e membro do Observat�rio das Elei��es, a falta de provas sobre poss�veis fraudes na urna eletr�nica torna a discuss�o sobre a seguran�a do sistema eleitoral brasileiro um tema infrut�fero.
“S� teria sentido voc� mudar o sistema se houvesse uma evid�ncia de que ele tem problema. N�o havendo evid�ncia, n�o existe raz�o para discuss�o. Porque n�o h� nenhuma evid�ncia de fraude. Essa � a famosa discuss�o sobre o sexo dos anjos. � uma coisa que um setor bem reacion�rio da pol�tica brasileira colocou na pauta e isso a� fica rendendo”, aponta Ranulfo.
Para o doutor em Ci�ncia Pol�tica, a incer- teza sobre as urnas, partida em grande parte por questionamentos feitos pelo presidente e candidato � reelei��o Jair Bolsonaro (PL), encontra eco em parte da popula��o por uma caracter�stica de desconfian�a arraigada nos brasileiros.
Ver galeria . 15 FotosApura��o manual de votos da elei��o de 1990 em Belo Horizonte
(foto: Cristina Horta/Arquivo EM - 4/10/1990 )
“O brasileiro tem uma desconfian�a sistem�tica das institui��es. Ainda mais se s�o institui��es pol�ticas. Ent�o, quase que por natureza, quando se pergunta ‘voc� confia em tal institui��o?’, � quase que autom�tico que a resposta seja ‘n�o’, mesmo que n�o se saiba explicar. Ent�o, a institui��o do voto acaba entrando nessa mar�, nessa desconfian�a meio at�vica que uma parte do eleitorado brasileiro tem. Desconfia-se de qualquer coisa, principalmente quando se refere � pol�tica. Mas � importante tamb�m dizer que a desconfian�a cresce porque existe uma forte propaganda por parte do governo e do meio bolsonarista. Tamb�m com uma forte intencionalidade. A inten��o � a seguinte: tumultuar a elei��o, descredenciar a elei��o. Simplesmente isso”, avalia.
Como apresentado nesta s�rie de reportagens, cerca de um ter�o do atual eleitorado brasileiro, mais de 50 milh�es de pessoas, s� participou de elei��es integralmente realizadas em urnas eletr�nicas. O n�mero cresce para 54% dos eleitores quando se avalia quem votou a partir de 1996, quando aconteceu a primeira experi�ncia com o equipamento no Brasil, em cidades com mais de 200 mil votantes.
Para Ranulfo, essa dist�ncia hist�rica tamb�m ajuda a explicar o sucesso de pautas que sugerem um retorno �s t�cnicas usadas h� quase 30 anos. “Boa parte das pessoas hoje n�o conhece o que era o voto impresso, n�? Ent�o, acha que o mundo come�ou no voto eletr�nico, e n�o sabe como era complicado. � que nem esquecer o que foi a ditadura militar.”
Auditoria
Propostas recentes incluem o retorno do papel como forma de auditoria das elei��es. A Proposta de Emenda � Constitui��o 135/19, conhecida como PEC do Voto Impresso, rejeitada pela C�mara dos Deputados no ano passado, previa que as urnas eletr�nicas imprimissem um comprovante do voto, que seria depositado em uma urna. Caso algum candidato suspeitasse do resultado das elei��es, seria poss�vel fazer a contagem dos pap�is.
Para Edson Resende de Castro, membro auxiliar da Procuradoria-Geral Eleitoral e coordenador eleitoral do Minist�rio P�blico de Minas Gerais (MPMG), a medida � um retrocesso aos problemas causados pela contagem manual de votos.
A partir deste domingo (28/8), o Estado de Minas recorda aqueles tempos em s�rie de reportagens com personagens que atuaram nos pleitos da segunda metade do s�culo 20, especialmente os dos anos 1980 e 1990, que precederam as urnas eletr�nicas.
“Imagine que teve a vota��o eletr�nica e o resultado foi X. Um partido n�o se conforma e quer conferir. Quando vai conferir, a gente tem a volta ao passado, que � jogar aqueles votos todos em cima da mesa e sair contando um por um, naquela mesma problem�tica. Seria trazer do passado esse cen�rio e colocar de volta, com toda aquela possibilidade de erros e de fraudes. Algu�m vai dizer ‘� uma forma de conferir’, mas n�s criar�amos uma forma de conferir que j� se mostrou ineficiente, problem�tica, fraudulenta, sujeita a erros. Outra quest�o seria: qual contagem vai prevalecer? A primeira, eletr�nica, ou a segunda, manual?”, questiona o promotor.
Quem trabalhou na coordena��o das elei��es manuais e nas eletr�nicas tamb�m tem dificuldade em entender as propostas que pedem o retorno do papel aos pleitos brasileiros. As servidoras aposentadas do TRE-MG e ex-chefes de cart�rio eleitoral Raquel Lott e Adriana Fulg�ncio contam, com bom humor, como reagem quando o tema vem � tona.
“O que eu falo para a pessoa � que, na hora em que tiver que ligar para algu�m em 2022, voc� procure uma fichinha, ache um orelh�o, vai l� e liga. � isso. N�o tem cabimento voltar para a vota��o manual, n�o tem cabimento”, afirma Raquel Lott. “Eu fico brava quando algu�m fala contra a urna, mas eu fico muito brava mesmo. � como se falassem de um filho meu”, complementa Adriana Fulg�ncio.
NOVO MODELO DE EQUIPAMENTO
Um novo modelo de urna eletr�nica ser� inaugurado nas elei��es de 2022. De acordo com o TSE, o novo equipamento tem um processador 18 vezes mais r�pido do que o modelo anterior e o teclado ter� uma tecnologia que acusa poss�veis erros de mau contato ou curto-circuito. Al�m disso, foram implantadas tecnologias para a acessibilidade, como a possibilidade de cadastro de um nome fon�tico e a apresenta��o de um int�rprete de Libras na tela da urna.
O TSE ressalta que as urnas permanecem sem qualquer dispositivo que permita acesso � internet ou bluetooth e o c�digo-fonte segue sendo disponibilizado e inspecionado por entidades p�blicas, universidades, partidos e pela sociedade em geral.
Desde que foram criadas, em 1996, a Justi�a Eleitoral adquiriu novas urnas em 1998, 2000, 2002, 2004, 2006, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013, 2015 e 2020, sempre seguindo rigorosos padr�es.