
Ela foi uma das 15 ganhadoras, selecionadas por um j�ri de especialistas de v�rios pa�ses, a receber o pr�mio International Rising Talents, concedido a jovens cientistas mulheres pela Funda��o L'Or�al em parceria com a Unesco (Organiza��o das Na��es Unidas para a Educa��o, a Ci�ncia e a Cultura). Medeiros recebeu 15 mil euros (cerca de R$ 84 mil) para investir em seus estudos.
Medeiros, que tem um doutorado pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e leciona Agroecologia e Engenharia Florestal na Universidade Federal de Alagoas (UFAL), estuda as rela��es entre as pessoas e plantas. Ela se interessou pelas plantas aliment�cias n�o convencionais (as chamadas PANCs) motivada pelo desejo de trabalhar com as comunidades extrativistas e auxili�-las a ampliar sua renda.
As plantas n�o convencionais s�o aquelas que n�o s�o conhecidas nos centros urbanos. Muitas delas s�o vendidas em feiras locais, como no interior do Alagoas, diz ela, mas nem chegam � capital.
Suas pesquisas t�m como base um trip� que leva em conta aspectos ecol�gicos (o manejo sustent�vel das plantas e frutas silvestres), sociais e nutricionais.
O objetivo � derrubar as barreiras que limitam o consumo de alimentos poucos conhecidos em centros urbanos ou subaproveitados como o ara��, jenipapo, taioba, cambu�, ouricori e pimenta rosa, entre outros.
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Primeiro, ela identifica, junto �s comunidades locais, quais esp�cies t�m potencial para se tornarem mais populares. Depois, realiza estudos ecol�gicos e com consumidores para descobrir quais s�o as plantas silvestres mais aceitas, qual � o p�blico-alvo (perfil de potenciais compradores), quais as melhores estrat�gias, inclusive de marketing, para apresentar esses produtos e para que eles cheguem aos centros urbanos.

Ela costuma, por exemplo, fazer associa��es para entender como as pessoas escolhem o que v�o comer, se � pelo nome, pela apar�ncia ou pelo cheiro.
O objetivo de Medeiros � auxiliar pequenos agricultores a identificar, divulgar e comercializar plantas e frutas silvestres. "A populariza��o dessas plantas vai ampliar a renda das comunidades", diz a cientista, acrescentando que ao mesmo tempo isso permite diversificar os nutrientes e as op��es alimentares, algo que ela afirma ser fundamental.
"Estudos mostram que os alimentos convencionais t�m defici�ncias de certos micronutrientes, como ferro e c�lcio, minerais que precisamos na nossa alimenta��o. Pesquisas tamb�m indicam que as plantas silvestres t�m muitos micronutrientes. Ent�o seria uma forma de diversificar e n�o de substituir os produtos tradicionais", afirma a jovem cientista, de 35 anos.
Os ara��s, por exemplo, t�m altos teores de vitamina C. J� o jenipapo � altamente energ�tico e tem uma quantidade interessante de certos micronutrientes, como ferro � c�lcio. Al�m disso, h� pesquisas em curso que indicam que o jenipapo teria propriedades funcionais e auxiliaria a evitar algumas doen�as.
"Cada uma dessas plantas tem um perfil nutricional diferente. Se conseguirmos incrementar a dieta com v�rias delas, podemos ter um espectro grande na alimenta��o", ressalta Medeiros.
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Segundo ela, o Brasil ainda aproveita pouco seu potencial alimentar. Isso se d� pelo receio da popula��o de consumir o que n�o � convencional. � a chamada "neofobia alimentar", o medo de comer coisas novas.
Seu trabalho tamb�m inclui estrat�gias para driblar a neofobia alimentar que pode desestimular o consumo de plantas silvestres e de esp�cies frut�feras selvagens. "� necess�rio diversificar para n�o sobrecarregar determinadas cadeias de alimentos. Esse � o ponto chave", destaca.
Mudan�as clim�ticas
As pesquisas de Medeiros foram premiadas, segundo a Funda��o L'Or�al, porque al�m de incluir novos produtos na alimenta��o, promovem a biodiversidade e a seguran�a alimentar, j� que essas plantas s�o mais adaptadas aos seus ambientes, e reduzem ainda a necessidade de agrot�xicos e de fertilizantes devido ao fato de nascerem na natureza.
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A cientista pernambucana, que faz suas pesquisas em �reas de restinga da costa brasileira, diz que � necess�rio ainda diversificar a alimenta��o por conta das mudan�as clim�ticas.
Segundo ela, n�o se sabe o que ocorrer� nas pr�ximas d�cadas e quais s�o os alimentos da agricultura convencional que estariam amea�ados e quais s�o as alternativas poss�veis.

"Quanto mais diversas forem nossas op��es alimentares, h� mais chances de ter elementos com os quais contar no futuro incerto. H� esp�cies mais resistentes �s altas temperaturas e, principalmente, � aus�ncia de chuvas."
Ela afirma que estudos indicam que nos pr�ximos 30 ou 50 anos o espa�amento entre as chuvas pode aumentar, o que causar� problemas, sobretudo para a agricultura familiar, que muitas vezes conta com a �gua da chuva como principal fonte de irriga��o.
Agricultura familiar
Para a cientista, que tem entre seus alunos trabalhadores rurais assentados, beneficiados pela reforma agr�ria, a agricultura familiar, que inclui os extrativistas, "� essencial para o provimento de alimentos de qualidade.".
Ela diz que h� preconceitos no Brasil em rela��o ao Movimento dos Sem Terra, mas s�o eles, defende, que produzem alimentos de qualidade e que "est�o na vanguarda", representando "a chave para a transi��o para uma agricultura mais sustent�vel".
Medeiros afirma que o governo brasileiro privilegia muito mais o agroneg�cio e deveria ter mais a��es voltadas para os agricultores familiares, que t�m, em sua vis�o, uma participa��o importante na produ��o de alimentos no Brasil.
A cientista pernambucana, que havia vencido a edi��o nacional do pr�mio da Funda��o L'Or�al e, por causa disso, p�de concorrer � premia��o internacional, conseguiu avan�ar em seu trabalho gra�as ao apoio financeiro do "Rising Talents" (Talentos Promissores, em tradu��o livre). "Isso me deu a possibilidade de fazer minha pesquisa da melhor maneira poss�vel", afirma.
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"N�o conhe�o muitos pesquisadores felizes no Brasil. N�o temos financiamento. Os cientistas n�o est�o conseguindo fazer suas pesquisas", lamenta ela, acrescentando que os investimentos na �rea ca�ram consideravelmente nos �ltimos anos.

"Tem muitos pesquisadores que precisam de insumo, de material, de reagentes, que est�o parados. A situa��o est� ser�ssima. Precisamos prensar com urg�ncia o que queremos para o pa�s", afirma.
"Um pa�s que n�o tem ci�ncia nem educa��o de qualidade n�o vai ter um protagonismo mundial no futuro. Para que esse protagonismo exista, � preciso ter cidad�os muito bem educados e uma ci�ncia forte e ativa", acrescenta Medeiros.
Em meio �s dificuldades gerais da pesquisa cient�fica no Brasil, as mulheres cientistas ainda s�o mais afetadas e enfrentam v�rios desafios, diz.
Segundo Medeiros, elas sofrem desvantagens como o fato de ocupar menos cargos de import�ncia em institui��es acad�micas e, por falta de apoio, t�m menos tempo para se dedicar ao trabalho quando se tornam m�es, o que n�o foi o seu caso.
"Algumas desistem de continuar as pesquisas e acabam apenas lecionando. � preciso uma mudan�a da sociedade e das institui��es", afirma.
"O mundo precisa de ci�ncia e a ci�ncia precisa de mulheres", diz a Funda��o L'Or�al, que apoia e capacita mulheres em tr�s �reas: pesquisa cient�fica, beleza inclusiva e mudan�as clim�ticas.
- Este texto foi originalmente publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-61959610
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