
Embora muito eficazes para combater a inflama��o — um processo desencadeado pelo organismo em resposta a infec��es ou les�es —, essa classe de medicamentos, que est� entre os mais prescritos no mundo, tem uma s�rie de efeitos colaterais, especialmente quando usada de forma cr�nica. As complica��es podem ser metab�licas, cardiovasculares e musculoesquel�ticas, al�m de neuropsiqui�tricas.
Devido a efeitos como ansiedade, depress�o, mania e del�rio, observados com frequ�ncia depois do uso prolongado, os pesquisadores resolveram investigar se essas drogas causam altera��es vis�veis no c�rebro. Para isso, utilizaram dados do Biobank, com meio milh�o de registros de sa�de de moradores do Reino Unido, de 40 a 69 anos. Segundo o artigo, estima-se que a preval�ncia do uso dos chamados glicocorticoides inalados ou em comprimidos varie entre 0,5% e 3% ao ano em pa�ses de alta renda. N�o h� dados sobre a utiliza��o em na��es em desenvolvimento.
Os pesquisadores analisaram exames de resson�ncia magn�tica cerebral de 222 pessoas que usavam esteroides sist�micos (em comprimido) e de 557 que utilizavam a forma inalat�ria, como as "bombinhas" para asma. As imagens foram comparadas a de 24.106 n�o usu�rios desse tipo de medicamento.
Nenhum dos participantes do estudo havia sido previamente diagnosticado com dist�rbios neurol�gicos, psiqui�tricos ou hormonais ou estava tomando rem�dios psiqui�tricos, como antidepressivos, afirma o estudo. Os volunt�rios tamb�m preencheram um question�rio para avaliar determinados aspectos do humor ao longo da quinzena anterior.
Efeitos
A compara��o dos resultados da resson�ncia magn�tica mostrou que o uso de esteroides sist�micos e inalat�rios foi associado a uma estrutura da subst�ncia branca menos intacta do que foi visto nos exames daqueles que n�o usaram esses medicamentos. A mat�ria branca tem um papel na conectividade neuronal e na sinaliza��o no c�rebro.
Esses efeitos foram maiores em usu�rios sist�micos, comparados aos de esteroides inalat�rios. Uma an�lise mais detalhada sugeriu que os efeitos podem ser ainda mais graves entre pacientes que fazem uso prolongado dessa classe de rem�dios. A utiliza��o em longo prazo foi associada a um n�cleo caudado maior, e o de bombinhas a uma am�gdala menor. Ambas s�o estruturas da massa cinzenta envolvidas nos processos cognitivo e emocional.
Segundo Onno Meijer, pesquisador do Centro M�dico da Universidade de Leiden, os usu�rios de esteroides sist�micos tamb�m tiveram um pior desempenho em um teste que mede a velocidade de processamento de informa��es, comparado aos n�o usu�rios. "Eles tamb�m relataram, significativamente, mais sintomas depressivos, apatia, inquieta��o e fadiga/letargia do que os n�o usu�rios. Os usu�rios de esteroides inalat�rios relataram apenas mais cansa�o/letargia e em menor grau do que os sist�micos", afirma.
Meijer alerta que, embora uma rela��o de causa e efeito entre o uso de glicocorticoides e as altera��es no c�rebro tenha sido demonstrada em pequenos estudos anteriores, o atual n�o "permite conclus�es formais sobre a causalidade". Al�m disso, no artigo, os autores ressaltam que "as altera��es relatadas podem estar relacionadas � condi��o para a qual os ester�ides foram prescritos e n�o ao pr�prio uso de esteroides".
Ainda assim, os pesquisadores n�o descartam que a mudan�a na estrutura e no volume do c�rebro seja um efeito colateral importante dos glicocorticoides. "Dada a ampla utiliza��o dessas drogas, m�dicos e pacientes precisam saber sobre os poss�veis efeitos no c�rebro", escreveram os pesquisadores, recomendando mais pesquisas sobre op��es de tratamento.
Olhar ampliado
Alisson Marques, m�dico psiquiatra do Instituto Meraki de Sa�de Mental
Alisson Marques, m�dico psiquiatra do Instituto Meraki de Sa�de Mental
J� � sabido o impacto dos glicocorticoides no campo neuropsiqui�trico. H� estudos bastante contundentes no que tange quadro de depress�o, ansiedade, mania e psicose. H� estudos mostrando o impacto sobre o volume cerebral predominante no hipocampo e na am�gdala. O estudo atual expande o olhar n�o somente no campo da altera��o de volume nas estruturas cerebrais da subst�ncia cinzenta, mas tamb�m nas microestruturas da subst�ncia branca. Importantes �reas cerebrais afetadas, como hipocampo, am�gdala, c�rtex e cerebelo podem interferir no humor como nas emo��es de raiva, medo, mem�ria, altera��o de autopreserva��o. Outro ponto de vista interessante � o aumento das queixas de sa�de mental em usu�rios cr�nicos de glicocorticoide, por�m sem altera��es em aspectos cognitivos. � importante lembrar que o pr�prio processo de adoecimento cr�nico pode gerar estresses biol�gicos que afetam o humor, inclusive do ponto de vista de altera��es em microestruturas cerebrais. Ainda se faz necess�rios outros estudos para elucidar o impacto do uso cr�nico de glicocorticoides.