
Se considerarmos que idosos s�o aqueles que t�m mais de 60 anos (nos pa�ses desenvolvidos � acima de 65 anos), a mulher de 40 anos, o alvo dos maledicentes coment�rios, encontra-se distante dessa faixa et�ria, entretanto tal condi��o n�o a impediu de ser ridicularizada pelas “colegas de sala”, que compartilhariam com ela os pr�ximos anos de forma��o acad�mica (as �ltimas informa��es indicam que as autoras do v�deo trancaram a matr�cula do curso, ap�s a repercuss�o nas m�dias).
O etarismo ou age�smo (derivado do ingl�s aging, que significa envelhecimento) � uma express�o abrangente para o preconceito e a discrimina��o em rela��o aos indiv�duos, com base em sua idade cronol�gica ou uma percep��o do outro como sendo “muito velho” ou “muito jovem” para se fazer algo. O termo foi usado pela primeira vez em 1969, pelo psiquiatra e ger�ntologo norte-americano Robert N. Butler, em um ensaio sobre a velhice nos EUA, que resultou em um pr�mio Pulitzer.
Em um mundo cada vez mais velho, o etarismo tem efeitos danosos sobre a popula��o, principalmente a idosa, causando flagelos trai�oeiros sobre essa parcela da sociedade. As consequ�ncias s�o nefastas e est�o relacionadas � forma, �s vezes inconsciente, de como as v�timas pensam, sentem e agem.
O mais impressionante � que talvez as agressoras n�o saibam, que tanto os idosos como os jovens adultos s�o, frequentemente, alvo de coment�rios ou atitudes preconceituosas devido � idade.
Os mais velhos sofrem nos locais de trabalho (onde s�o os principais alvos) e com a acentuada redu��o de acesso � forma��o e educa��o especializadas, enquanto os mais jovens sofrem discrimina��o em �reas como emprego, sa�de, habita��o e pol�tica, pois muitas vezes n�o t�m voz. O preconceito de idade contra jovens e idosos � um problema recorrente, mas � mais prejudicial sobre aqueles que acumularam mais tempo de vida.
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Os efeitos mais preocupantes desse comportamento p�rfido incidem sobre a sa�de f�sica e mental dos mais velhos. De acordo com estimativas da Organiza��o das Na��es Unidas (ONU), no mundo, h� 6,3 milh�es de pessoas que apresentam casos de depress�o desencadeados pelo age�smo. O sentimento de solid�o e n�o pertencimento ao grupo humano imediato t�m consequ�ncias graves e muito doloridas sobre o idoso.
Como h� uma tend�ncia em n�o reconhecer a real gravidade do problema, isso impede de encontrar uma solu��o, com impactos profundos para a sociedade e para a economia. Os custos com doen�as ligadas aos estere�tipos da velhice e autopercep��es negativas resultam em gastos anuais de bilh�es de d�lares em v�rios pa�ses.
O envelhecimento da popula��o � um fato que vai perdurar e acentuar-se nas d�cadas futuras, com exce��o de alguns pa�ses, em especial, entre os africanos, que ainda n�o realizaram grandes avan�os no processo de transi��o demogr�fica. Onde o processo avan�a � um motivo de j�bilo, pelas melhores condi��es de vida, que permitem viver mais, mas � acompanhado de preocupa��es diversas: a amplia��o e acesso a um sistema de sa�de eficiente, previd�ncia social, manuten��o da produtividade econ�mica e garantia de uma velhice com mais dignidade.
As pessoas est�o vivendo mais em todo o mundo. Entre 2015 e 2050, a propor��o da popula��o mundial com mais de 60 anos quase dobrar� de 12% (900 milh�es de pessoas) para 22% (2 bilh�es de pessoas). Essa din�mica demogr�fica ocorre num ritmo veloz e se estende por um n�mero consider�vel de pa�ses (isso inclui o Brasil). Esse fato implica uma necessidade urgente e crucial de estabelecer respostas que favore�am a compreens�o social e, consequentemente, respeito ao processo de envelhecimento global.
O envelhecer �, geralmente, interpretado como um processo de fragilidade e decl�nio da capacidade humana. A representa��o dessa faixa et�ria como um grupo homog�neo, dependente de cuidados, que exige altos gastos com sa�de e assist�ncia social e de ser obst�culos ao crescimento econ�mico traduzem as percep��es e suposi��es equivocadas comumente aceitas sobre os idosos e a senilidade.
Em um mundo onde a rapidez � a ordem da vez, a velhice impede exatamente de viver em condi��es extremas de agilidade. Ent�o, � comum desclassificar e desvalorizar o que o tempo traz de benef�cios. O idoso torna-se um estorvo, um impedimento �s exig�ncias do mundo atual para muitas pessoas, e isso alimenta a ignor�ncia, o preconceito e o abandono.
A pandemia da Covid-19 exp�s, em parte, essa quest�o, principalmente, em 2020, quando os mais vulner�veis � doen�a eram os mais velhos. O mundo parou para proteg�-los ao longo daquele per�odo. Entretanto, muitos adultos, naquele fat�dico ano, consideraram o �nus demasiadamente alto para as gera��es futuras, que iriam custear a recess�o econ�mica, decorrente do confinamento, por meio do desemprego ou aumento do endividamento pessoal. Para esse grupo, sacrificar os jovens � sa�de dos velhos era uma aberra��o!
As pesquisas realizadas em 2021 indicavam a gratid�o e felicidade que os idosos sentiam pelo ato, mas as mesmas pesquisas mostravam a insatisfa��o dos jovens com a realidade crua a que foram submetidos, obrigados a alterar a forma de vida, para evitar a exposi��o dos mais velhos ao v�rus letal daqueles tempos mais sombrios.
Nada foi feito para tentar desfazer essas interpreta��es. A omiss�o est� cobrando seu pre�o, refor�ada pelas tristes e revoltantes imagens divulgadas nos �ltimos dias e, ao que se sabe, representa uma fra��o min�scula de todo esse infort�nio. Os pensamentos discriminat�rios est�o disseminados entre as v�rias classes de idade, carregados de desinforma��o sobre a funcionalidade observada na velhice e a diversidade de condi��es de sa�de que caracterizam os mais longevos. O desconhecimento alimenta a ignor�ncia, e essa, por sua vez, ampara o preconceito.
H� grandes diferen�as quando se trata da velhice. Assim como as rochas sofrem, de formas distintas, os efeitos das intemp�ries naturais – algumas estruturas rochosas desgastam mais rapidamente, enquanto outras, de idade similar, permanecem exuberantes nas paisagens. Da mesma forma � a esp�cie humana: em alguns o processo � mais acelerado do que em outros, mas a velhice � retratada, equivocadamente, como um processo �nico e igual para todos.
H� quem diga que a velhice est� na cabe�a. O indiv�duo pode ser muito velho aos 30 anos, como pode ser muito jovem aos 90. Na vis�o atual, o velho � aquele menos novo que voc�, n�o precisa acumular d�cadas e d�cadas para ser tratado como tal, quase como cidad�o de segunda classe.
O tratamento dedicado �s mulheres mais velhas � ainda mais preocupante e perverso. At� no envelhecimento os homens acumulam mais vantagens. N�o importa se as mulheres vivem mais que eles. As portas ainda se abrem mais facilmente aos grisalhos masculinos. As mulheres se tornam bruxas velhas, horr�veis no imagin�rio de muitos.
Na busca para barrar o natural envelhecimento, os experimentos mais surreais s�o aplicados. L�bios, bocas e bochechas s�o “inflados”, na busca pela eterna juventude. A poderosa ind�stria farmac�utica fatura trilh�es com o com�rcio dos “milagrosos” produtos, vendidos como a f�rmula que impede o envelhecer.
N�o reconhecer o valor dos fios brancos e das rugas que sulcam a face humana est� na raiz do preconceito, que surge no seio familiar e se retroalimenta na volatilidade e superficialidade da sociedade atual. N�o buscar os meios de reverter tais posturas torna o futuro, de um mundo cada vez mais velho, insens�vel e muito assustador.