
West Duffy reconhece o impacto do capitalismo no esgotamento que muitos trabalhadores est�o sentindo. O burnout � uma das muitas raz�es que podem nos levar ao ponto de n�o apreciar nosso trabalho, mas pedir demiss�o n�o � uma alternativa vi�vel para muitas pessoas.
Existem estrat�gias para tentar extrair o melhor do emprego de que n�o gostamos e crescer nesse processo.
West Duffy, que foi assessora de l�deres de empresas como Google e LinkedIn, escreveu, em conjunto com a ilustradora Liz Fosslien, o best-seller do Wall Street Journal No Hard Feelings: The Secret Power of Embracing Emotions at Work (lan�ado em portugu�s com o t�tulo "Sem Neura: o segredo para lidar com as emo��es no trabalho"), al�m do livro Big Feelings: How to be Okay when Things are not Okay ("Grandes sentimentos: como ficar bem quando as coisas n�o est�o bem", em tradu��o livre).
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Outra pesquisadora deste tema � Ana Sanz Vergel, professora de psicologia do trabalho da Escola de Administra��o de Norwich e da Universidade de East Anglia, no Reino Unido. Ela declarou � BBC News Mundo - o servi�o em espanhol da BBC - que "atualmente, este � um t�pico relevante, � uma realidade".
Estas s�o as estrat�gias fascinantes que elas prop�em:

Pare e pense: qual o motivo do descontentamento?
O job crafting n�o � um conceito novo. Ele j� vem atraindo pesquisadores de diversos pa�ses h� alguns anos e � a chave para as duas especialistas. Trata-se de modelar nosso trabalho para torn�-lo mais significativo, fazendo "pequenas mudan�as no dia a dia", segundo Sanz.
Mas, antes disso, � importante parar e refletir sobre a situa��o onde nos encontramos. West Duffy reconhece que pode ser realmente assustador sentir que n�o gostamos do nosso trabalho. Por isso, ela acredita que � fundamental tentar especificar qual � a principal raz�o que nos fez perder a motiva��o.
"Avalie o que produz o desajuste. Por que voc� n�o est� feliz nesse trabalho? Ele n�o se adapta aos seus interesses?", questiona Sanz.
"� por excesso de trabalho e n�o h� recurso para reduzi-lo? Voc� n�o tem apoio do supervisor, por exemplo? Ou, ao contr�rio, � um trabalho muito enfadonho e n�o h� oportunidade de desenvolvimento, n�o h� variedade de tarefas ou talvez voc� sinta que ele n�o tem significado para a sociedade?"
Quando voc� encontrar onde est� o desequil�brio, come�a a proatividade.

O exemplo dos limpadores de janelas
"Sempre digo aos alunos que, em vez de pensar na vida como algo que passa por n�s, como sujeitos passivos, a vida � tamb�m o que fazemos acontecer, como sujeitos proativos", explica Sanz. "� preciso abandonar essa ideia de que o trabalho � algo que vem pronto e projetado. Voc� tamb�m precisa reprojet�-lo, at� em empregos que podem ser rotineiros."
Ela conta sobre um grupo de limpadores de janelas do Hospital Infantil Hershey, da Pensilv�nia, nos Estados Unidos, onde v�rios pacientes sofrem de c�ncer. Eles se perguntaram: "como podemos tornar nosso trabalho mais significativo e tamb�m mais divertido?"
Eles decidiram se fantasiar de super-her�is. Atrav�s das janelas, era poss�vel ver Batman, o Super Homem, o Homem Aranha e o Capit�o Am�rica. E, nesse dia, diversas enfermeiras e outros funcion�rios do centro m�dico tamb�m usaram algo relacionado aos super-her�is.
"As crian�as ficaram felizes", conta a professora, como mostra o v�deo feito pelo hospital.
"Depois disso, outros hospitais come�aram a fazer a mesma coisa e, em entrevista com os funcion�rios, eles disseram que esse pequeno gesto, de um lado, fez com que eles se divertissem - algo que chamamos de playful work design: tentar fazer seu trabalho se tornar mais divertido", destaca Sanz. "E, por outro lado, ele mudou a rela��o que eles tinham com o pr�prio cliente (o hospital) e os pacientes. Criou uma rela��o mais pr�xima."
Segundo a especialista, eles pr�prios reavaliaram seu trabalho. "Eles j� n�o eram apenas os limpadores de janelas com quem ningu�m se importa, mas sim sentiam que tinham muito valor para as crian�as do hospital."
Este exemplo inclui v�rios tipos de job crafting:
- Como voc� aborda sua atividade
- Reavalia cognitivamente o significado do seu trabalho
- Provoca mudan�as das rela��es interpessoais � sua volta

Reconex�o com o prop�sito
Segundo West Duffy, no processo de job crafting, � importante ter em mente as raz�es e motiva��es do nosso trabalho, j� que isso nos permite entrar em sintonia com elas. "A resposta pode ser, por exemplo: para sustentar minha fam�lia, quando eu passar pelas emo��es di�rias que esse trabalho me proporciona, terei �timas lembran�as."
West Duffy conta que seu primeiro livro incluiu o exemplo de uma trabalhadora do metr� de Nova York, nos Estados Unidos, para quem o prop�sito do seu trabalho � cuidar dos passageiros. "E assim, mesmo com muitos aspectos realmente dif�ceis no seu trabalho, momentos mon�tonos ou dias em que ela preferiria n�o ir, ela tem um prop�sito geral."
Quando h� atrasos dos trens ou algo inesperado acontece no sistema, ela pega o microfone e explica aos passageiros o que est� acontecendo. "Certa vez, um trem ficou parado entre duas esta��es por v�rias horas e ela passou por todos os vag�es para ter certeza que os passageiros soubessem que estavam a salvo", relata ela.
Em outro exemplo, a especialista menciona que os baristas podem ter um trabalho repetitivo, mas muitos deles fazem arte com os caf�s que melhoram a manh� dos seus clientes todos os dias. "� �til que eles se recordem disso", destaca ela.
N�o veja seu emprego como uma lacuna no curr�culo
Esperando conseguir o trabalho da sua vida, voc� pode achar que o seu trabalho atual � uma esp�cie de lacuna, um intervalo na sua carreira, mas n�o acredite nisso. Por mais longe que voc� possa estar do emprego dos seus sonhos, na complexa din�mica trabalhista, tudo resulta em experi�ncia e conhecimento.
"Cada dia em um trabalho � importante, mesmo que n�o gostemos dele. Cada dia � uma pe�a de Lego que est� erguendo uma constru��o", destaca Sanz. "O que voc� fizer neste momento est� construindo o seu trabalho e o do futuro."
Para a professora, pequenos comportamentos s�o fundamentais para extrair o melhor do trabalho que j� temos. E um deles � dar um passo � frente e expressar-se.
"Identifique seus pontos fortes e trate de ser proativo para comentar com seu gerente se voc� pode fazer melhor uso deles no seu trabalho - se eles podem dar a voc� uma tarefa que se ajuste mais a eles", aconselha Sanz. "N�o seja t�mido e diga: 'sou bom nisto, considerem que eu posso fazer isto'."
"As pessoas imaginam que a organiza��o precisa ter algo a oferecer e � verdade, mas voc� tamb�m tem responsabilidade pela sua carreira e pelo que voc� deseja construir para o futuro", ressalta ela.
Para as pessoas que est�o no mesmo emprego h� muito tempo, este pode ser o momento de tentar tornar-se mentor ou projetar um curso de forma��o para outros colegas. Isso pode ajudar a gerar o que West Duffy chama de "conex�o humana", que � fundamental tamb�m para nossa motiva��o.
Procure o que o motiva
Para Sanz, tamb�m � importante "identificar suas limita��es e ser suficientemente proativo para pedir o treinamento que for preciso para melhorar algumas habilidades". Isso � conhecido como "aumentar os recursos estruturais e � uma forma de job crafting".
Trata-se de conseguir forma��o e aprender coisas novas, que n�o s� ajudar�o voc� a fazer seu trabalho, mas tamb�m t�m o potencial de abrir novas portas dentro da organiza��o.
West Duffy afirma que, em alguns casos, podemos sentir que n�o temos nada de novo para aprender nesse cargo e isso prejudica a motiva��o. "Para pessoas que fazem trabalhos repetitivos, este pode ser um problema", afirma ela. "Mas vale a pena perguntar: como posso acrescentar algo como aprendizado?"
"Voc� poderia, por exemplo, pensar em um cargo de gerente ou pedir a algu�m de outra �rea para fazer um interc�mbio de habilidades, para que voc�s possam receber treinamento m�tuo", aconselha ela. "Acredito que, quando ficamos adultos, esquecemos que precisamos estar aprendendo para nos motivar, algo que as crian�as fazem todo o tempo."
Pe�a feedback

Neste processo de falar no emprego, � importante pedir feedback para o seu supervisor e seus colegas. Muitas vezes, o problema � que n�o sabemos se estamos fazendo bem o trabalho, nem como ele � percebido pelos demais.
"Isso faz com que as pessoas se sintam muito inseguras no seu trabalho", explica Sanz. E tamb�m � fundamental pedir ajuda, algo que "muitas vezes n�o se faz por medo".
"A organiza��o tamb�m tem responsabilidade por gerar um ambiente de trabalho no qual voc� sinta que pode pedir apoio", segundo Sanz. Afinal, falar com os chefes e colegas de trabalho pode nos fazer descobrir aspectos que podem tornar o dia a dia mais positivo.
"Por exemplo, alternar entre tarefas mais complexas e mais simples. Se as tarefas forem simples demais e nos deixarem entediados, devemos tentar come�ar um novo projeto que tenha um objetivo", aconselha ela.
J� para os que t�m excesso de trabalho, � fundamental concentrar-se em como reduzir essa sobrecarga e reestrutur�-las em tarefas menores, por exemplo.
Segundo West Duffy, para algumas pessoas, sentir que elas n�o t�m independ�ncia no trabalho prejudica sua motiva��o. "Existem empregos em que � imposs�vel conseguir a autonomia que voc� deseja, para ter mais controle sobre os seus hor�rios e sobre o que fazer a cada dia."
Mas, em outros, isso � poss�vel - e explorar essa possibilidade pode fazer uma grande diferen�a. Voc� pode, por exemplo, pedir ao seu chefe que avalie os resultados e n�o os processos. "Se voc� puder criar seus pr�prios processos, ficar� mais motivado do que se for microgerenciado", segundo West Duffy. "Se alcan�ar os mesmos resultados, o gerente poder� aceit�-los."
�s vezes, n�o � o trabalho, mas uma pessoa
Depois da reflex�o inicial proposta pelas especialistas, � poss�vel que se descubra que o problema n�o s�o realmente as exig�ncias do trabalho, mas algo que tem a ver com as rela��es interpessoais.
"Fico estressada quando fa�o um trabalho em grupo, n�o me escutam nas reuni�es ou me ignoram. Ou o supervisor sempre me d� feedback negativo", afirma Sanz.
Situa��es como essas n�o devem ser ignoradas, por mais inc�modo que possa ser, e muito menos as emo��es negativas que voc� estiver sentindo. "� preciso falar com a pessoa que gera esse estresse e faz�-lo de forma assertiva, para procurar uma solu��o para o problema e evitar que ele aumente." Se n�o for poss�vel ou n�o houver resultado, � importante buscar o apoio de outra pessoa.
"�s vezes, � um problema de ass�dio no trabalho, de bullying, mais que da tarefa em si", destaca Sanz. "As organiza��es devem oferecer uma rede de apoio, por exemplo, atrav�s do Departamento de Recursos Humanos. De fato, os problemas interpessoais s�o os mais graves e, caso se tornem frequentes, podem fazer com que a pessoa acabe deixando a organiza��o."

Pensamento coletivo
"Na sociedade norte-americana - pode ser diferente em outros pa�ses -, temos a tend�ncia de p�r a maior parte da culpa nos indiv�duos", destaca West Duffy. "N�s dizemos: se voc� est� esgotado, a culpa � sua, voc� precisa fazer melhor seu trabalho, gerenciar seu hor�rio com mais efici�ncia. Se voc� n�o encontra a forma de ser pai e trabalhar ao mesmo tempo, a culpa � sua."
E, muitas vezes, a mensagem dominante � que o trabalhador "deve ser mais resiliente. Mas as pesquisas demonstram que, de fato, ser resiliente � realmente dif�cil em um ambiente que centraliza tudo no indiv�duo", afirma ela.
Por isso, pensar coletivamente pode trazer resultados positivos. "Por exemplo, como podemos acrescentar mais intervalos ao nosso dia, apoiar os pais que trabalham ou ajudar-nos mutuamente a lidar com as mudan�as que est�o acontecendo?", questiona ela.
West Duffy escreveu, em conjunto com Fosslien, o artigo intitulado Stop Telling Employees to be Resilient ("Pare de dizer aos funcion�rios que sejam resilientes", em tradu��o livre), na revista MIT Sloan. Dirigido aos gerentes, o artigo defende a import�ncia de criar sistemas de apoio e di�logo para que as equipes possam navegar pelas incertezas e mudan�as.
"Os l�deres devem pensar em estabelecer melhores pr�ticas coletivas", segundo a autora. "Com isso em mente, se voc� se sentir � vontade enquanto trabalhador para fazer alguma sugest�o para a equipe ou o gerente, isso ser� ben�fico."
"Acredito que, muitas vezes, n�o � que os l�deres e gerentes n�o queiram ajudar sua equipe com o esgotamento, � que eles mesmos tamb�m est�o esgotados", afirma West Duffy. "Est�o t�o ocupados que para eles � dif�cil dar um passo atr�s e dizer 'como posso ajudar minha equipe?'"
Sanz acredita que � fundamental evitar ficar em um ambiente de trabalho t�xico. "Talvez a pessoa acabe deixando o emprego porque est� ficando doente. A sa�de vem em primeiro lugar. Mas existem muitas coisas que se pode tentar antes de chegar a essa situa��o."
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