As tratativas para garantir as vacinas contra a covid-19 come�aram muito antes do que se imagina: no dia 1° de maio de 2020, o Reino Unido anunciou que havia garantido 90 milh�es de doses do imunizante AZD1222, que naquele momento estava sendo desenvolvido e estudado por AstraZeneca e Universidade de Oxford.
Come�ava ali uma verdadeira corrida mundial para a compra dos primeiros lotes dos produtos que protegem contra o coronav�rus: ao longo dos meses seguintes, outros 51 pa�ses abriram negocia��es com 16 laborat�rios farmac�uticos e institutos de pesquisa diferentes.
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At� janeiro de 2021, esse grupo de na��es j� havia firmado acordos que certificaram a poss�vel entrega de mais de 5,4 bilh�es de doses das vacinas em estudo.
Esses dados fazem parte de um levantamento feito pela reportagem da BBC News Brasil, que compilou e organizou as informa��es disponibilizadas no site do Centro de Inova��o em Sa�de Global da Universidade Duke, nos Estados Unidos.
Detalhe importante: muitas dessas encomendas de vacinas foram realizadas antes mesmo da aprova��o para uso pelas ag�ncias regulat�rias de cada local — no Brasil, o �rg�o respons�vel por fazer essa libera��o � a Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria, a Anvisa.
Vale destacar que nenhum pa�s aplicou esses produtos antes da libera��o por essas entidades de sa�de p�blica: a negocia��o antecipada serviu apenas para garantir os primeiros lotes fabricados.
Assim, quando os resultados de efic�cia e seguran�a dos estudos cl�nicos foram publicados, muitas dessas na��es puderam sair na frente e iniciaram as campanhas de imuniza��o antes do resto do mundo.

Esses achados contradizem o discurso de alguns senadores durante a CPI da Pandemia: ao longo das sess�es, parlamentares argumentaram que o Brasil n�o poderia ter feito acordo com a Pfizer ou outras farmac�uticas no segundo semestre de 2020, antes que a Anvisa desse sinal verde �s vacinas.
Por�m, como mostram os registros, o Brasil tamb�m faz parte desse grupo de 52 pa�ses que se antecipou e encomendou milh�es de doses dos imunizantes antes de qualquer aval de sua ag�ncia regulat�ria.
Como o levantamento foi feito?
Como citado anteriormente, o Centro de Inova��o em Sa�de Global da Universidade Duke possui um site dedicado a registrar a compra de vacinas contra a covid-19 e a distribui��o das doses pelo mundo.
De acordo com os registros, os primeiros acordos come�aram a ser divulgados em maio de 2020, momento em que Reino Unido e Estados Unidos adquiriram 90 milh�es e 300 milh�es de doses da AZD1222, respectivamente.
Naquele est�gio, esse imunizante ainda estava nas fases iniciais de pesquisa: o estudo cl�nico de fase 3, o �ltimo antes da aprova��o pelas ag�ncias regulat�rias, iria come�ar no dia 28 de agosto de 2020 e seus resultados preliminares s� seriam divulgados cerca de tr�s meses depois.
Ou seja: diante da crise de sa�de p�blica, os pa�ses precisaram negociar antecipadamente, mesmo sem ter certeza absoluta se aquele produto realmente funcionaria na preven��o da covid-19.
Sabe-se que os contratos com os laborat�rios produtores traziam cl�usulas que vinculavam o pagamento e a entrega � comprova��o de seguran�a e efic�cia e � libera��o das ag�ncias regulat�rias.
Em outras palavras, os governos locais s� efetivariam a compra ap�s a aprova��o das vacinas pelas ag�ncias reguladoras, mesmo se os imunizantes se mostrassem capazes de barrar a infec��o pelo coronav�rus ou as suas formas mais graves.
Durante o levantamento, a BBC News Brasil considerou o per�odo entre maio de 2020 e janeiro de 2021, quando nosso pa�s teve as suas duas primeiras vacinas aprovadas pela Anvisa: a AZD1222 (Oxford/AstraZeneca) e a CoronaVac (Sinovac/Instituto Butantan).
Confira a seguir a lista completa dos locais que encomendaram doses durante os meses que antecederam a libera��o das ag�ncias regulat�rias. A ordem est� de acordo com o an�ncio dos acordos de compra:
- Am�ricas: Estados Unidos, Canad�, Brasil, M�xico, Equador, Rep�blica Dominicana, El Salvador, Costa Rica, Panam�, Venezuela, Chile, Argentina, Col�mbia, Bol�via, Peru e Uruguai.
- Europa: Reino Unido, Uni�o Europeia*, Turquia, Ucr�nia, Belarus, S�rvia, Maced�nia e Alb�nia.
- �frica: Uni�o Africana*.
- �sia: Israel, Jap�o, Vietn�, Cazaquist�o, �ndia, Nepal, Ar�bia Saudita, Taiwan, Catar, Indon�sia, Filipinas, Mal�sia, Coreia do Sul, Tail�ndia, Bangladesh, Kuwait, China, Emirados �rabes Unidos, Iraque, L�bano, Mianmar, Paquist�o, Azerbaij�o, Om� e Jord�nia.
- Oceania: Austr�lia e Nova Zel�ndia
*Uni�o Europeia e Uni�o Africana negociaram a compra de vacinas em bloco, para depois fazerem a distribui��o para os pa�ses que comp�em os grupos.
Quem foi pra frente
Al�m da participa��o dos 52 pa�ses, h� outros detalhes que chamam a aten��o no levantamento: � curioso notar, por exemplo, que os acordos foram feitos com 16 farmac�uticas e institutos de pesquisas diferentes.
Alguns desses fabricantes conseguiram evoluir bem nesses �ltimos meses e j� est�o com o seu produto aprovado e usado em v�rios locais.
� o caso, por exemplo, das vacinas AZD1222 e Cominarty (Pfizer/BioNTech) que, at� janeiro de 2021, aparecem em mais de 37 encomendas cada.
Campe�o de negocia��o com cerca de 930 milh�es de doses reservadas at� o in�cio do ano, o imunizante de Pfizer e BioNTech foi garantido com anteced�ncia por 35 pa�ses.
J� 1,4 bilh�o de doses do produto de AstraZeneca e Universidade de Oxford est�o contempladas em contratos assinados por 31 na��es diferentes.
Na contram�o, outros candidatos promissores seguem nas fases de estudo cl�nico at� hoje: � o caso dos testes que s�o conduzidos pelos laborat�rios CureVac, GSK/Sanofi e Medicago.
Geopol�tica e voracidade pela vacinas
Um terceiro aspecto interessante � o padr�o de distribui��o das vacinas de acordo com a influ�ncia de alguns pa�ses ou das pr�prias empresas.
Os imunizantes de Pfizer/BioNTech e Moderna, por exemplo, foram proporcionalmente mais utilizados nos pa�ses ricos, como Estados Unidos, Canad�, os integrantes da Uni�o Europeia e Israel.
J� os produtos criados na China, como a CoronaVac (Sinovac), e na R�ssia, caso da Sputnik V (Instituto Gamaleya), acabaram endere�ados com mais frequ�ncia para Am�rica Latina, �sia e Leste Europeu.
A "voracidade" dos pa�ses mais ricos tamb�m � evidente na an�lise: das 5,4 bilh�es de doses negociadas at� janeiro de 2021, 3,4 bilh�es foram reservadas por Estados Unidos, Uni�o Europeia, Reino Unido, Canad�, Jap�o e Austr�lia.

Esse grupo tamb�m se destaca por outro aspecto: a variedade nas apostas.
O Reino Unido, por exemplo, fez dez encomendas com sete farmac�uticas diferentes (AstraZeneca/Oxford, Janssen, Moderna, Novavax, Pfizer, Sanofi/GSK e Valneva).
J� os Estados Unidos fecharam nove contratos, com seis laborat�rios (AstraZeneca/Oxford, Janssen, Moderna, Novavax, Pfizer e Sanofi/GSK).
A estrat�gia foi clara: num per�odo em que ainda n�o se sabia qual vacina daria certo e se mostraria eficaz, as na��es mais ricas diversificaram suas aquisi��es.
Assim, caso uma candidata n�o fosse bem nos estudos cl�nicos, existiam outras op��es para garantir o in�cio da campanha o mais rapidamente poss�vel.
E o Brasil no meio de tudo isso?
A primeira encomenda de vacinas feita pelo nosso pa�s foi fechada em 6 de agosto de 2020: nesse dia, o Minist�rio da Sa�de anunciou a encomenda de 90 milh�es de doses da AZD1222.
O acordo tamb�m j� previa a futura transfer�ncia de tecnologia, para que o produto fosse 100% fabricado no Brasil, sem depender do envio de Insumo Farmac�utico Ativo (IFA) — esse contrato, inclusive, foi ratificado nesta quarta-feira (01/06), o que garantir� mais autonomia ao pa�s.
A segunda encomenda foi selada no dia 30 de dezembro de 2020, quando o Governo Federal fechou a compra de 46 milh�es de doses da CoronaVac, que � finalizada e distribu�da pelo Instituto Butantan a partir do IFA importado da China.
A Anvisa s� daria aprova��o emergencial para a CoronaVac e a AZD1222 no dia 17 de janeiro de 2021.
A exemplo de outros pa�ses, o Brasil se movimentou e garantiu sim alguns lotes no segundo semestre de 2020, quando a efic�cia e a seguran�a das vacinas ainda eram um mist�rio.
Ao contr�rio de outras na��es, por�m, o quantitativo de doses encomendadas n�o era o suficiente para cobrir toda a nossa popula��o — e corremos o risco de estreitar nossas chances ao "apostar" em apenas dois produtores (se um deles n�o se sa�sse bem nos testes cl�nicos, estar�amos sem alternativas imediatas).

Seguindo essa linha de racioc�nio, portanto, o argumento de que o Minist�rio da Sa�de n�o poderia ter negociado com a Pfizer de forma antecipada (antes da aprova��o da Anvisa) n�o se sustenta.
Numa reportagem publicada na BBC News Brasil em 14 de maio, o m�dico e advogado sanitarista Daniel Dourado, do Centro de Pesquisa em Direito Sanit�rio da Universidade de S�o Paulo, explicou que esse argumento "� totalmente furado".
"A aprova��o da Anvisa n�o tem nada a ver com as quest�es contratuais e comerciais", pontuou.
"Os contratos sempre vinculavam a entrega das doses � aprova��o pelas autoridades sanit�rias", refor�ou Dourado, que tamb�m integra o Institut Droit et Sant� da Universidade de Paris, na Fran�a.
"Me parece que o governo n�o queria comprar vacinas porque achava que n�o iria precisar. Eles acreditaram naquela conversa de imunidade coletiva por cont�gio e agora est�o usando essas justificativas", completou o especialista.
A epidemiologista Carla Domingues, que foi coordenadora do Programa Nacional de Imuniza��es (PNI) do Minist�rio da Sa�de entre 2011 e 2019, criticou a falta de crit�rios claros nas negocia��es.
"O governo assinou o acordo com a AstraZeneca ainda no segundo semestre de 2020 e ia fechar o contrato com o Instituto Butantan para a compra da Coronavac em outubro, se o presidente [Jair Bolsonaro] n�o tivesse intervindo e desautorizado o ent�o ministro da Sa�de, Eduardo Pazuello. Por que s� com a Pfizer teria que aguardar?", perguntou.
Falas da CPI
Num depoimento realizado no dia 13 de maio, o gerente-geral da farmac�utica na Am�rica Latina, Carlos Murillo, confirmou que o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) rejeitou tr�s ofertas de 70 milh�es de doses, realizadas pelo laborat�rio em agosto de 2020.
De acordo com o representante da empresa, as primeiras remessas da Cominarty poderiam ter sido entregues ao pa�s ainda em dezembro do ano passado, o que permitiria iniciar a campanha de vacina��o com cerca de um m�s de anteced�ncia (considerando que o pedido de aprova��o do imunizante e a resposta da Anvisa tamb�m seriam antecipados).
Na sess�o do dia 27 de maio, foi a vez do diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmar que o Brasil poderia ter se tornado o primeiro pa�s do mundo a come�ar a vacina��o contra a covid-19.
Segundo o m�dico, o Butantan realizou na metade de 2020 tr�s ofertas para aquisi��o da CoronaVac, mas o Governo Federal n�o respondeu aos contatos.
A primeira sinaliza��o positiva ocorreu em outubro de 2020.

"Tudo estava indo muito bem. Tanto que, em 20 de outubro, fui convidado pelo ministro [Eduardo] Pazuello para uma cerim�nia na qual a vacina seria anunciada", relatou Covas.
"A partir deste ponto, � not�rio que houve uma inflex�o. No outro dia de manh�, quando ainda haveria conversas adicionais, isso n�o aconteceu porque o presidente [Jair Bolsonaro] disse que n�o haveria continua��o nesse processo", completou o diretor do Butantan.
Entre tantas promessas, debates, proje��es, encomendas e compras, o fato � que a campanha de vacina��o contra a covid-19 no Brasil est� prestes a completar cinco meses.
At� agora, 22,6 milh�es de pessoas foram completamente imunizadas, com as duas doses preconizadas.
Isso representa pouco mais de 10% da popula��o.
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Vacinas contra COVID-19 usadas no Brasil
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- CoronaVac/Butantan
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Como funciona o 'passaporte de vacina��o'?
Os chamados passaportes de vacina��o contra a COVID-19 est�o em funcionamento em algumas regi�es do mundo e em estudo em v�rios pa�ses.
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Em casos graves, as v�timas apresentam
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- Insufici�ncia renal
Os tipos de sintomas para COVID-19 aumentam a cada semana conforme os pesquisadores avan�am na identifica��o do comportamento do v�rus.
Entenda as regras de prote��o contra as novas cepas
Mitos e verdades sobre o v�rus
Nas redes sociais, a propaga��o da COVID-19 espalhou tamb�m boatos sobre como o v�rus Sars-CoV-2 � transmitido. E outras d�vidas foram surgindo: O �lcool em gel � capaz de matar o v�rus? O coronav�rus � letal em um n�vel preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar v�rias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS n�o teria condi��es de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um m�dico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronav�rus.Para saber mais sobre o coronav�rus, leia tamb�m:
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