“Eu n�o tenho anticorpos contra o coronav�rus, mesmo ap�s vacinado”, afirma um m�dico em um v�deo compartilhado mais de 38 mil vezes nas redes sociais desde o dia 12 de julho de 2021.
Ele detalha ter tomado duas doses da vacina CoronaVac e ter realizado um teste de “titula��o de anticorpos”, que teve resultado negativo.
“CUIDADO. Voc� pode ter tido o mesmo PROBLEMA que eu . UMA FALSA PROTE��O”, disse o m�dico na legenda do v�deo compartilhado no Facebook e no TikTok.
O v�deo foi compartilhado tamb�m no Twitter e no Youtube em outros perfis. “Dr. Delano tomou as duas doses de Coronavac e fez a testagem de anticorpos 6 meses depois. Resultado? N�o est� imunizado! Calcinha Apertada sua vacina vale tanto quanto voc�. Nada!”, diz um usu�rio.
Algumas das cr�ticas fazem parte da rivalidade entre o presidente Jair Bolsonaro e o governador de S�o Paulo, Jo�o Doria, que protagonizaram embates durante a pandemia relacionados � vacina CoronaVac. “Calcinha apertada” � como alguns dos apoiadores do presidente chamam o governador, em refer�ncia �s suas vestimentas.
No v�deo, o m�dico afirma ter realizado um teste de titula��o de anticorpos para verificar se estava imune ao SARS-CoV-2, v�rus causador da covid-19. Ele mostra o resultado de seu exame e diz que teve “10% de resultado, quando deveria ter dado acima de 20 ou 50%”. Ele afirma, ainda, que essa � a prova de que ele n�o tem anticorpos contra o novo coronav�rus, mesmo tendo sido vacinado. Depois, exige a aplica��o de uma nova dose de imunizante.
Sorologia e prote��o vacinal
O exame realizado pelo m�dico � um tipo de teste sorol�gico, que identifica a quantidade de anticorpos contra o v�rus que o organismo tem em circula��o.Larissa Brussa, doutora em gen�tica e biologia molecular e divulgadora cient�fica da Rede An�lise Covid-19, explicou ao AFP Checamos que o teste sorol�gico “seria como um teste para detec��o [de anticorpos]”. J� a “titula��o de anticorpos”, � qual se refere o autor do v�deo, pode ser inclusa no resultado oferecido pelo teste sorol�gico e identifica a quantidade de anticorpos existentes, explicou a pesquisadora.
Esses testes, no entanto, n�o s�o recomendados para indicar se uma pessoa est� imune ou n�o ao v�rus, pois os anticorpos neutralizantes encontrados nesses testes n�o s�o os �nicos que comp�em o sistema imunol�gico. “A imunidade conta com v�rios outros agentes, como a imunidade celular, atrav�s das c�lulas de defesa. [...] A imunidade � um mecanismo muito complexo”, destaca a pesquisadora.
A Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa) desaconselha o uso de tais testes sorol�gicos para atestar a prote��o vacinal desde mar�o de 2021, quando publicou uma nota t�cnica sobre o assunto.
Nela, a Anvisa destaca que “n�o existe at� o momento defini��o da quantidade m�nima de anticorpos neutralizantes necess�ria para conferir prote��o imunol�gica contra a infec��o pelo SARS-Cov-2”.
Assim, a afirma��o do m�dico de que em seu exame era preciso ter acima de 20% ou 50% de anticorpos neutralizantes para ser considerado imune tamb�m � enganosa, pois n�o h� evid�ncias cient�ficas que fundamentem esses dados.

Em um comunicado emitido em junho de 2021, a Anvisa informou que os produtos atualmente registrados no Brasil permitem somente identificar se uma pessoa j� se infectou pelo SARS-CoV-2. “Os testes dispon�veis n�o foram avaliados para verificar o n�vel de prote��o [natural ou vacinal] contra o novo coronav�rus”.
A Ag�ncia de Medicamentos e Alimentos (FDA) dos Estados Unidos tamb�m desaconselha o uso dos testes sorol�gicos para avaliar se algu�m est� protegido contra o v�rus, “especialmente ap�s a pessoa ter recebido a vacina contra a COVID-19”, e recomenda que sejam usados apenas com a finalidade de identificar se j� ocorreu uma infec��o pelo novo coronav�rus.
Brussa ainda indicou ao Checamos que n�o h� testes no mercado que permitam identificar se uma pessoa est�, de fato, imune ao SARS-CoV-2, ou que avaliem o n�vel geral da imunidade.
Repercuss�o do v�deo
Um dia ap�s a publica��o do v�deo, em 13 de julho, a Secretaria de Sa�de de Divin�polis (MG) %u23AF cidade do m�dico autor do v�deo %u23AF publicou uma nota de esclarecimento, em resposta aos “crescentes questionamentos sobre a realiza��o de exames para avaliar a efic�cia de vacinas e das solicita��es de doses adicionais de imunobiol�gicos”.Na nota, a Prefeitura desaconselhou avaliar a imunidade contra o novo coronav�rus a partir de testes que dosam anticorpos neutralizantes.
Cita, tamb�m, um documento no qual a Sociedade Brasileira de Imuniza��es (SBIm) lembra que a resposta imune desenvolvida por meio da vacina��o n�o depende apenas de anticorpos neutralizantes, pois h� a imunidade inata, que tamb�m atua na prote��o contra infec��es. A SBIm conclui:
“A complexidade que envolve a prote��o contra a doen�a torna desaconselh�vel a dosagem de anticorpos neutralizantes com o intuito de se estabelecer um correlato de prote��o cl�nica”.
O Instituto Butantan, que produz a CoronaVac em parceria com a farmac�utica chinesa Sinovac, publicou em sua conta no Twitter que o v�deo � uma “Fake News, um desservi�o � sa�de”. “Testes sorol�gicos n�o servem para avaliar prote��o, contra a Covid-19, como j� alertou a Anvisa”, finalizou.
Procurado pelo AFP Checamos, o instituto reiterou as informa��es divulgadas na nota da SBIm e indicou uma publica��o do Governo de S�o Paulo no Facebook, na qual verifica as informa��es divulgadas pelo m�dico de Divin�polis e desaconselha o uso de testes de anticorpos para medir a prote��o vacinal.
A CoronaVac � eficaz?
O Butantan tamb�m afirmou � AFP que a vacina CoronaVac � eficaz, o que foi comprovado “pelos testes cl�nicos realizados com 12.500 volunt�rios e que embasaram a aprova��o de uso emergencial pela Anvisa e, mais recentemente, pela pr�pria Organiza��o Mundial da Sa�de”.
Um artigo publicado no �ltimo m�s de junho por cientistas do Butantan mostrou que a efic�cia da CoronaVac para casos sintom�ticos atingiu 50,7%. Na an�lise, os pesquisadores apontam que o imunizante pode chegar a uma efic�cia global %u23AF prote��o contra casos leves, moderados ou graves %u23AF de 62,3%.
A publica��o tamb�m constata a efic�cia da vacina contra as variantes P.1 e P.2, surgidas no Brasil, chamadas pela OMS como Gamma e Zeta, respectivamente.
O Instituto Butantan refor�ou ao Checamos “que a vacina��o � uma estrat�gia de sa�de coletiva e n�o somente individual”.
A divulgadora cient�fica e doutora em biologia celular Rafaela Ribeiro disse � AFP que, por ser uma estrat�gia de sa�de coletiva, a vacina��o deve ter a ades�o do maior n�mero de pessoas poss�vel, mesmo que cada indiv�duo possa ter uma resposta imunol�gica diferente.
“O importante � que se muitos se vacinarem, vamos formar um escudo de transmiss�o, no qual alguns geram uma resposta diferente do outro com maior ou menor intensidade, que diminui a circula��o do v�rus e ainda, o mais importante, impede o desenvolvimento da doen�a”, explicou a pesquisadora.
Um exemplo do que Ribeiro apontou � o Projeto S, desenvolvido pelo Instituto Butantan em Serrana (SP). Para o estudo, toda a popula��o adulta da cidade foi imunizada com duas doses da CoronaVac, levando os casos sintom�ticos da covid-19 a diminuirem em 80%. As interna��es ca�ram 86% e as mortes, 95%.
Autoria da publica��o
O m�dico Delano Santiago, que aparece no v�deo viralizado, � registrado no Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG) e atende em uma cl�nica particular em Divin�polis.Ap�s a repercuss�o de sua postagem, o m�dico publicou outro v�deo, em que reconhece que o teste realizado para identificar os anticorpos neutralizantes n�o � capaz de comprovar sozinho que uma pessoa n�o est� imune ao v�rus.
O AFP Checamos entrou em contato por telefone e e-mail com Laborat�rio Central, onde o m�dico afirmou ter realizado o exame, mas n�o obteve resposta at� a publica��o desta mat�ria.
Um conte�do semelhante tamb�m foi checado pela Ag�ncia Lupa.
Leia mais sobre a COVID-19
- Vacinas contra COVID-19 usadas no Brasil e suas diferen�as
- Minas Gerais tem 10 vacinas em pesquisa nas universidades
- Entenda as regras de prote��o contra as novas cepas
- Como funciona o 'passaporte de vacina��o'?
- Os protocolos para a volta �s aulas em BH
- Pandemia, epidemia e endemia. Entenda a diferen�a
- Quais os sintomas do coronav�rus?