Exatos quatro meses separam o in�cio do esc�ndalo do relat�rio final apresentado pelo relator da CPI na Assembleia, deputado estadual C�ssio Soares (PSD). O caso veio � tona em 8 de mar�o deste ano, a partir de reportagem divulgada inicialmente por Portal R7 e Record TV Minas.
Inicialmente, falou-se em 500 servidores do governo de Minas imunizados, sendo que alguns n�o tinham atua��o direta com a pandemia do coronav�rus ou estavam at� em regime de teletrabalho. � �poca, somente 666 mil pessoas no estado tinham recebido a primeira dose da vacina contra COVID-19.
Dois dias depois, em 10 de mar�o, Carlos Eduardo Amaral esteve na Assembleia para apresentar como andava o combate � pandemia. Ele, contudo, foi confrontado sobre o descumprimento da ordem de vacina��o. Presidente do Legislativo, o deputado estadual Agostinho Patrus (PV) repudiou o caso e o classificou como “trem da alegria”. Amaral, por sua vez, disse que estava entre os vacinados e que foi imunizado para servir de exemplo aos demais, mas o governo n�o divulgou nenhuma a��o a respeito.
Tamb�m em 11 de mar�o, a ALMG abriu a CPI dos 'fura-fila' para investigar os respons�veis pelo caso no governo de Minas. Al�m disso, uma s�rie de listas com os nomes dos servidores vacinados come�aram a ser divulgadas pelo Legislativo.
O que eram 500 passou para 800 e, posteriormente, at� 2 mil servidores vacinados, com o governo incluindo trabalhadores de outras cidades para al�m de Belo Horizonte, capital mineira e cidade que hospeda a Cidade Administrativa, sede do governo estadual. A vacina��o denunciada fora dos padr�es do Plano Nacional de Imuniza��o (PNI) aconteceu em BH.
Suposta interfer�ncia e ca�a a documento inexistente
Os meses de apura��o foram marcados por reuni�es tensas na ALMG e at� casos bizarros. Diversos servidores e ex-integrantes da Ses depuseram � CPI, incluindo os quatro que tiveram indiciamento solicitado - al�m de Amaral, os nomes de Luiz Marcelo Cabral Tavares, ex-secret�rio-adjunto de Sa�de de Minas; Jo�o Pinho Tavares, ex-chefe de gabinete de Amaral; e Jana�na Passos de Paula, subsecret�ria de Vigil�ncia em Sa�de de Minas, comp�em a den�ncia.
Em 20 de maio, dia do depoimento de Amaral - considerado piv� de todo esquema de vacina��o - � CPI, o presidente da comiss�o, deputado estadual Jo�o V�tor Xavier (Cidadania), afirmou que o ex-secret�rio estava mentindo. O ex-servidor argumentou que estava no terceiro grupo de prioridades, que contemplava servidores em trabalho de campo, mas o parlamentar n�o teve o mesmo entendimento.
“Eu tinha v�rias perguntas para fazer. At� porque isso � um direito de defesa do senhor. Mas s�o desnecess�rias as minhas perguntas a partir deste momento. N�o vou gastar meu tempo e o tempo de quem est� aqui para perguntar a algu�m que se disp�e, clara e nitidamente, a mentir”, disse Jo�o V�tor Xavier.
Gastos
A CPI tamb�m se aprofundou nos gastos do governo de Minas em sa�de no ano de 2020. Esta parte, mais curta, teve in�cio em junho e culminou em recomenda��es para que o poder Executivo mineiro torne mais transparente o processo de divulga��o do cumprimento do percentual m�nimo, fixado pela Constitui��o Federal, de investimentos em sa�de.
O relat�rio
O relat�rio ser� colocado em vota��o �s 16h desta quinta-feira, mesmo dia em que foi divulgado. Ele denuncia Amaral e outros tr�s ex-servidores por peculato e improbidade administrativa. O texto precisa ser aprovado na reuni�o desta tarde para que a den�ncia siga ao MPMG.
O que � uma CPI?
As comiss�es parlamentares de inqu�rito (CPIs) s�o instrumentos usados por integrantes do Poder Legislativo (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores) para investigar fato determinado de grande relev�ncia ligado � vida econ�mica, social ou legal do pa�s, de um estado ou de um munic�pio. Embora tenham poderes de Justi�a e uma s�rie de prerrogativas, comit�s do tipo n�o podem estabelecer condena��es a pessoas.
Para ser instalado no Senado Federal, uma CPI precisa do aval de, ao menos, 27 senadores; um ter�o dos 81 parlamentares. Na C�mara dos Deputados, tamb�m � preciso aval de ao menos uma terceira parte dos componentes (171 deputados).
H� a possibilidade de criar comiss�es parlamentares mistas de inqu�rito (CPMIs), compostas por senadores e deputados. Nesses casos, � preciso obter assinaturas de um ter�o dos integrantes das duas casas legislativas que comp�em o Congresso Nacional.
Ap�s a coleta de assinaturas, o pedido de CPI � apresentado ao presidente da respectiva casa Legislativa. O grupo � oficialmente criado ap�s a leitura em sess�o plen�ria do requerimento que justifica a abertura de inqu�rito. Os integrantes da comiss�o s�o definidos levando em considera��o a proporcionalidade partid�ria — as legendas ou blocos parlamentares com mais representantes arrebatam mais assentos. As lideran�as de cada agremia��o s�o respons�veis por indicar os componentes.
Na primeira reuni�o do colegiado, os componentes elegem presidente e vice. Cabe ao presidente a tarefa de escolher o relator da CPI. O ocupante do posto � respons�vel por conduzir as investiga��es e apresentar o cronograma de trabalho. Ele precisa escrever o relat�rio final do inqu�rito, contendo as conclus�es obtidas ao longo dos trabalhos.
Em determinados casos, o texto pode ter recomenda��es para evitar que as ilicitudes apuradas n�o voltem a ocorrer, como projetos de lei. O documento deve ser encaminhado a �rg�os como o Minist�rio P�blico e a Advocacia-Geral da Uni�o (AGE), na esfera federal.
Conforme as investiga��es avan�am, o relator come�a a aprimorar a linha de investiga��o a ser seguida. No Congresso, sub-relatores podem ser designados para agilizar o processo.
As CPIs precisam terminar em prazo pr�-fixado, embora possam ser prorrogadas por mais um per�odo, se houver aval de parte dos parlamentares.
O que uma CPI pode fazer?
chamar testemunhas para oitivas, com o compromisso de dizer a verdade
convocar suspeitos para prestar depoimentos (h� direito ao sil�ncio)
executar pris�es em caso de flagrante
solicitar documentos e informa��es a �rg�os ligados � administra��o p�blica
convocar autoridades, como ministros de Estado — ou secret�rios, no caso de CPIs estaduais — para depor
Ir a qualquer ponto do pa�s — ou do estado, no caso de CPIs criadas por assembleias legislativas — para audi�ncias e dilig�ncias
quebrar sigilos fiscais, banc�rios e de dados se houver fundamenta��o
solicitar a colabora��o de servidores de outros poderes
elaborar relat�rio final contendo conclus�es obtidas pela investiga��o e recomenda��es para evitar novas ocorr�ncias como a apurada
pedir buscas e apreens�es (exceto a domic�lios)
solicitar o indiciamento de envolvidos nos casos apurados
O que uma CPI n�o pode fazer?
Embora tenham poderes de Justi�a, as CPIs n�o podem:
julgar ou punir investigados
autorizar grampos telef�nicos
solicitar pris�es preventivas ou outras medidas cautelares
declarar a indisponibilidade de bens
autorizar buscas e apreens�es em domic�lios
impedir que advogados de depoentes compare�am �s oitivas e acessem
documentos relativos � CPI
determinar a apreens�o de passaportes
A hist�ria das CPIs no Brasil
A primeira Constitui��o Federal a prever a possibilidade de CPI foi editada em 1934, mas dava tal prerrogativa apenas � C�mara dos Deputados. Treze anos depois, o Senado tamb�m passou a poder instaurar investiga��es. Em 1967, as CPMIs passaram a ser previstas.
Segundo a C�mara dos Deputados, a primeira CPI instalada pelo Legislativo federal brasileiro come�ou a funcionar em 1935, para investigar as condi��es de vida dos trabalhadores do campo e das cidades. No Senado, comit� similar foi criado em 1952, quando a preocupa��o era a situa��o da ind�stria de com�rcio e cimento.
As CPIs ganharam estofo e passaram a ser recorrentes a partir de 1988, quando nova Constitui��o foi redigida. O texto m�ximo da na��o passou a atribuir poderes de Justi�a a grupos investigativos formados por parlamentares.
CPIs famosas no Brasil
1975: CPI do Mobral (Senado) - investigar a atua��o do sistema de alfabetiza��o adotado pelo governo militar
1992: CPMI do Esquema PC Farias - culminou no impeachment de Fernando Collor
1993: CPI dos An�es do Or�amento (C�mara) - apurou desvios do Or�amento da Uni�o
2000: CPIs do Futebol - (Senado e C�mara, separadamente) - rela��es entre CBF, clubes e patrocinadores
2001: CPI do Pre�o do Leite (Assembleia de MG e outros Legislativos estaduais, separadamente) - apurar os valores cobrados pelo produto e as diretrizes para a formula��o dos valores
2005: CPMI dos Correios - investigar den�ncias de corrup��o na empresa estatal
2005: CPMI do Mensal�o - apurar poss�veis vantagens recebidas por parlamentares para votar a favor de projetos do governo
2006: CPI dos Bingos (C�mara) - apurar o uso de casas de jogo do bicho para crimes como lavagem de dinheiro
2006: CPI dos Sanguessugas (C�mara) - apurou poss�vel desvio de verbas destinadas � Sa�de
2015: CPI da Petrobras (Senado) - apurar poss�vel corrup��o na estatal de petr�leo
2015: Nova CPI do Futebol (Senado) - Investigar a CBF e o comit� organizador da Copa do Mundo de 2014
2019: CPMI das Fake News - dissemina��o de not�cias falsas na disputa eleitoral de 2018
2019: CPI de Brumadinho (Assembleia de MG) - apurar as responsabilidades pelo rompimento da barragem do C�rrego do Feij�o