Meus av�s paternos vieram da Pol�nia logo antes da guerra, e amavam o sol, o clima e, em especial, as frutas, coloridas, saborosas, abundantes. Foram parar em Ouro Preto mas, ap�s 30 anos, deixam as ladeiras de Vila Rica para tr�s e se mudam para Belo Horizonte. O endere�o escolhido foi a Avenida Afonso Pena, 1.456, pertinho do Conservat�rio.
O Edif�cio S�o Jos� foi o escolhido porque, al�m de ser o que cabia no bolso, debru�ava-se majestosamente sobre o Parque Municipal, com uma vista de tirar o f�lego. Moravam “de frente para o mar”.
A vida no Centro � prop�cia para uma vida a p�, sem carro, at� porque todo o com�rcio e os servi�os, o trabalho e a vida social aconteciam num raio de uns poucos quarteir�es. Uma verdadeira "cidade de 15 ou 20 minutos".
Naquela �poca, o pessoal ainda fazia contas e conhecia o custo de se produzir um lote e a infraestrutura urbana necess�ria. Exatamente por isso, a legisla��o n�o apenas permitia como incentivava uma ocupa��o plena dos lotes, com a maior densidade poss�vel.
E, assim, o Edif�cio S�o Jos� ocupa todo o terreno, sem afastamento frontal, sem afastamentos laterais e iluminando um dos quartos, a cozinha e a �rea de servi�o por um fosso de ilumina��o e ventila��o. Nada demais, nada de mais, nada de menos.
Uns quartos eram, claro, melhores do que os outros, mas o apartamento funcionava muito bem, com boa ilumina��o, ventila��o cruzada e uma �rea comum �nfima, reduzida ao m�nimo necess�rio. O resultado � �bvio: custo de manuten��o e taxas de condom�nio reduzidas.
Uns quartos eram, claro, melhores do que os outros, mas o apartamento funcionava muito bem, com boa ilumina��o, ventila��o cruzada e uma �rea comum �nfima, reduzida ao m�nimo necess�rio. O resultado � �bvio: custo de manuten��o e taxas de condom�nio reduzidas.
O lote tem pouco mais de 460 m², mas acomoda mais de 70 apartamentos (73, salvo engano) e 2 lojas no t�rreo. S�o 2 apartamentos olhando para o Parque, 2 para o pr�dio dos fundos e as 2 lojas alinhadas no passeio, mostrando que a fachada ativa n�o � um conceito novo (embora s� tenha voltado � legisla��o urban�stica em 2019, numa reda��o errada, que contraria a l�gica do com�rcio e estraga os resultados esperados).
As lojas sempre funcionaram, porque alinhadas no passeio, na mesma configura��o em que tiveram sucesso nos quatro cantos do globo, nos �ltimos 3.000 anos.
N�o por acaso, os apartamentos da frente valem uns 50% mais do que os do fundo; afinal, uma vista que vai do Parque Municipal � Serra da Piedade � um privil�gio pelo qual as pessoas acham que valha a pena pagar.
N�o me lembro se, em algum momento, o Edif�cio S�o Jos� teve estacionamento mas, se teve, meus av�s nunca usaram (tampouco sentiram falta). Pela baixa vac�ncia, parece n�o fazer falta at� hoje. Achei 4 apartamentos � venda, e s�.
Atualmente, estivesse o terreno do Edif�cio S�o Jos� dispon�vel, poder�amos fazer ali, quem sabe, 1 ou 2 lojas, afastadas 4 ou 5 metros do passeio por um gramado desinteressante (como desinteressante e pouco comerciais seriam as lojas), e mais uns 8 apartamentos, num pr�dio quase dez vezes menor, obrigatoriamente afastado dos vizinhos. As �reas comuns seriam, obrigatoriamente, bem maiores e a taxa de condom�nio, por consequ�ncia, muito maior. Invi�vel, e gerando apartamentos cujo custo ser� 3 a 4 vezes maior do que os im�veis atualmente existentes no Edif�cio S�o Jos�.
O resumo da �pera � o seguinte: trocar�amos 2 boas lojas por 2 lojas ruins, e ter�amos 10% dos apartamentos, cada um deles com um custo 3 vezes maior e taxas de condom�nio muito mais altas.
Trouxe o apartamento de meus av�s e o Edif�cio S�o Jos�, tanto pelas muitas e �timas mem�rias, quanto para demonstrar o qu�o emblem�tico �, num espa�o de 50 anos, passarmos de uma legisla��o que incentivou o adensamento e reduziu o custo de infraestrutura por habitante, para uma legisla��o que promove o exato oposto.
- Belo Horizonte: s� decola se fechar o aeroporto
Importante lembrar que a guinada na legisla��o n�o vem das gest�es atuais, mas l� de 1976, quando a gest�o de Luiz Verano, prefeito indicado ("bi�nico"), promove uma mudan�a radical, abandona princ�pios consagrados at� hoje nas cidades europeias e abra�a conceitos moderninhos como coeficiente de aproveitamento, afastamento frontal, afastamentos laterais e altura m�xima na divisa.
Parece grego, mas � aquele portugu�s tecnicista, feito por especialistas de biblioteca, pretensamente elegante e profundo, coisa restrita aos "iniciados". O problema � que eram teses ainda n�o testadas de forma ampla, e seus efeitos sobre a cidade s� seriam sentidos de forma clara algumas d�cadas depois.
Atualmente, os reflexos desses efeitos est�o presentes diariamente em nossa vida cotidiana, com os engarrafamentos sem fim, o encarecimento dos apartamentos, o aumento dos alugu�is e, na face mais nefasta, na expuls�o dos moradores para outros munic�pios.
Atualmente, os reflexos desses efeitos est�o presentes diariamente em nossa vida cotidiana, com os engarrafamentos sem fim, o encarecimento dos apartamentos, o aumento dos alugu�is e, na face mais nefasta, na expuls�o dos moradores para outros munic�pios.
Fala-se muito em distribui��o de renda e promo��o de oportunidades, mas pouco sobre a responsabilidade da cidade na exclus�o objetiva dos menos afortunados.
Quando algu�m precisa morar a mais de 2 horas do seu emprego e da vida na cidade (com tudo que a cidade proporciona, como lazer, cultura, empregos, socializa��o, educa��o de melhor qualidade, inova��o), a exclus�o � real e, na maioria das vezes, insuper�vel e incorrig�vel.
Quando algu�m precisa morar a mais de 2 horas do seu emprego e da vida na cidade (com tudo que a cidade proporciona, como lazer, cultura, empregos, socializa��o, educa��o de melhor qualidade, inova��o), a exclus�o � real e, na maioria das vezes, insuper�vel e incorrig�vel.
Densidade � inclus�o e igualdade de oportunidades, mas a cidade que pode promover, tamb�m pode excluir.
O que � dif�cil de compreender �: o adensamento em zonas com infraestrutura n�o custa para o poder p�blico. Ao contr�rio, quanto mais apartamentos e neg�cios, maior a receita para o poder p�blico. Quanto maior a densidade, quanto mais gente morando numa geografia menor, menos transporte p�blico � necess�rio, menos carros nas ruas.
Vai entender.