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Estado de Minas DIREITO E SA�DE

M�dico � demitido por atendimento humanizado

Quem � o vil�o: o m�dico ou a m�e do paciente? Nenhum deles! � a nossa sociedade de valores invertidos, e altamente manipul�vel por opini�es est�pidas


02/06/2023 15:19
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Estetoscópio
O m�dico foi punido por mostrar empatia e sensibilidade, o sonho de todo paciente! (foto: Pixabay/Reprodu��o)
A inusitada demiss�o de um m�dico no �ltimo dia 18, decorrente do atendimento de uma crian�a de 9 anos em uma UPA da rede p�blica de Osasco/SP, tomou as manchetes nas �ltimas 2 semanas. O paciente apresentava inflama��o na garganta e sintomas gripais, e o m�dico prescreveu amoxicilina, ibuprofeno, dipirona e prednisona. Ao final da receita, o motivo de sua demiss�o: a divertida prescri��o de sorvete de chocolate 2 vezes ao dia, e “Free Fire” (jogo eletr�nico) di�rio. Inconformada, a m�e do paciente jogou o caso nas redes sociais, acusando o m�dico de debochar do paciente. O profissional foi massacrado pelos internautas, e poucos dias depois, demitido. 
 
Em mais de 15 anos de Direito M�dico, quando finalmente acho que j� vi de tudo na �rea da sa�de, me deparo com esta absurda demiss�o. Na prescri��o, constava toda a medica��o prevista na literatura m�dica para tratamento da enfermidade do jovem paciente. Segundo a pr�pria m�e, durante a consulta o m�dico questionou ao garoto o sabor de sorvete que ele mais gostava (o alimento � constantemente indicado por m�dicos e dentistas para aliviar a dor, pelo efeito anest�sico). E o jogo? Possivelmente, s� um inofensivo ato de simpatia do m�dico para distrair a crian�a, que sofria com os sintomas. 

Verdade seja dita: o m�dico foi punido por mostrar empatia e sensibilidade, o sonho de todo paciente! Em meio a uma rede p�blica repleta de profissionais que sequer olham nos olhos do paciente, ele se atreveu a ser humano e simp�tico com uma crian�a doente, e lamentavelmente, pagou caro por isso. 
 

Talvez ele tenha se esquecido que vivemos em uma sociedade doente, de valores invertidos, na qual reina absoluta a cultura da lacra��o e do cancelamento social. Que ao menor sinal de descontentamento com algo incontestavelmente positivo e ben�fico (como o atendimento dispensado pelo m�dico no caso em quest�o), os cr�ticos lhe submetem ao cruel julgamento das redes sociais, a pra�a p�blica da era moderna, onde o povo anseia �vido junto � forca para uma execu��o sum�ria e precipitada, sem qualquer direito de defesa.  

O m�dico foi exposto, demitido, e teve sua reputa��o arranhada, de forma t�o injusta quanto ocorre com centenas ou milhares de outros m�dicos em todo o mundo. Mas na maioria dos casos h� pelo menos algum dano ao paciente, ainda que sem responsabilidade do m�dico. Neste caso, absurdamente, o foco de toda a crise � simplesmente um atendimento humanizado e emp�tico.   
 

O que mais chamou a aten��o no caso, foi o destempero e a incompet�ncia dos gestores, que mesmo diante de fatos t�o claros e uma cr�tica t�o absurda, demitiram o m�dico para atender � reivindica��o da “patota da lacrosfera”. O que eles n�o esperavam � que, logo em seguida, os lacradores passariam a defender o m�dico, e a acusar a m�e do paciente.  

O resultado? Em poucos dias o pr�prio prefeito determinou o retorno do m�dico �s atividades. J� a m�e da crian�a, se defendeu dizendo que sua inten��o era mostrar o descaso dos m�dicos de Osasco, que sequer olham na cara dos pacientes. Sem d�vidas, ela n�o poderia ter escolhido uma consulta mais inadequada para basear sua cr�tica, pois o m�dico em quest�o agiu exatamente de forma contr�ria. Para criticar o descaso de alguns, ela atacou a empatia de outro, e causou sua demiss�o.  Mas n�o podemos presumir que a m�e teve m�s inten��es, como sustentado pelos cr�ticos. Talvez seja somente uma pessoa simples, agindo de forma emocional e precipitada por n�o compreender a atitude do m�dico, e por ter um longo hist�rico de frustra��es no atendimento da rede p�blica de sa�de. 
 

Casos como este mostram o quanto a nossa sociedade � fr�gil sob o ponto de vista moral, �tico e emp�tico. Estamos perigosamente sujeitos ao humor dos haters, vivemos sob a ditadura de uma opini�o p�blica cega e precipitada governada por influenciadores t�xicos, que direcionam o povo ao cancelamento social de pessoas inocentes, por motivos absurdos. 

Talvez por isto, outros m�dicos se abstenham em defender publicamente colegas que vivem situa��es an�logas. As chances de se tornarem alvo do cancelamento junto com a v�tima s�o grandes, pois para tanto, n�o � necess�rio qualquer m� conduta ou mancha na carreira, basta discordar dos haters. 

Mas nada explica a neglig�ncia dos Conselhos de Classe, que deveriam se manifestar em defesa dos profissionais em situa��es absurdas como a presente. Procurado pela imprensa, o CREMESP se limitou a informar que “est� investigando o caso”. N�o esper�vamos que o conselho sa�sse em defesa do profissional antes da apura��o definitiva dos fatos, mas explicar � sociedade o �bvio equ�voco da cr�tica, � seu incontest�vel dever. 

Quem � o vil�o da hist�ria, a m�e ou o m�dico? Nenhum deles! O vil�o � a nossa sociedade, altamente manipul�vel por pessoas maldosas com opini�es est�pidas. E como membros desta sociedade, � dever de todos mudar esta realidade, para que nossos filhos e netos vivam sem medo, em um ambiente coletivo menos ingrato para com os bons cidad�os. 


Renato Assis � advogado, especialista em Direito M�dico e Odontol�gico h� 15 anos, e conselheiro jur�dico e cient�fico da ANADEM. � fundador e CEO do escrit�rio que leva seu nome, sediado em Belo Horizonte/MG e atuante em todo o pa�s.     

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