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Estado de Minas DIREITO E SA�DE

CRM � condenado a indenizar paciente v�tima de abuso

A decis�o do STJ, condenando o CRM pelo crime do m�dico, � um recado claro da sociedade aos conselhos estaduais de medicina, e ao pr�prio CFM


31/03/2023 23:07 - atualizado 31/03/2023 23:10
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Fachada do Superior Tribunal de Justiça - STJ
Fachada do Superior Tribunal de Justi�a - STJ (foto: Lucas Pricken/STJ)
A comunidade m�dica foi impactada nesta semana pela manuten��o da condena��o, por parte da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justi�a (STJ), de um dos Conselhos Regionais de Medicina a indenizar uma adolescente que sofreu abuso sexual durante uma consulta m�dica.

A decis�o do STJ aponta a neglig�ncia do CRM no acompanhamento dos profissionais que atuam sob sua tutela. Segundo os ministros, o m�dico em quest�o nunca deveria ter sido habilitado ao exerc�cio da medicina. O autor dos crimes possu�da um consider�vel hist�rico de antecedentes, tanto na juventude quanto no curso da forma��o m�dica. Chegou a ser expulso de duas resid�ncias m�dicas, em fun��o da m� conduta. Ainda assim, foi aceito e registrado pelo CRM.

O caso nos induz a uma inevit�vel reflex�o: qual � o papel dos Conselhos Regionais de Medicina e do CFM? A m� pr�tica dos profissionais que atuam sob sua tutela, seria mesmo de sua responsabilidade? Em casos como o presente, entendemos que a resposta � positiva.
 

O Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Medicina s�o regulamentados pela Lei nº 3.268 de 1957. Constituem juntos uma autarquia, parte da administra��o p�blica indireta. Exercem, portanto, uma atividade p�blica, tendo o interesse p�blico como alvo. O art. 2º da referida lei disp�e:

Art. 2º O conselho Federal e os Conselhos Regionais de Medicina s�o os �rg�os supervisores da �tica profissional em toda a Rep�blica e ao mesmo tempo, julgadores e disciplinadores da classe m�dica, cabendo-lhes zelar e trabalhar por todos os meios ao seu alcance, pelo perfeito desempenho �tico da medicina e pelo prest�gio e bom conceito da profiss�o e dos que a exer�am legalmente.

Portanto, a atua��o dos conselhos n�o deve ser focada em extremos. Nem corporativista (protegendo unicamente os interesses dos m�dicos), nem como um tribunal de exce��o (perseguindo e punindo m�dicos indevidamente). Deve haver um equil�brio, sempre com vistas ao interesse publico. Contudo, se perguntarmos a qualquer leigo a fun��o dos conselhos, certamente a resposta ser� a defesa incondicional dos interesses dos m�dicos. E embora esta n�o seja a fun��o, � exatamente a impress�o que os conselhos passam � sociedade: uma atua��o extremamente classista, em defesa unicamente da pr�pria classe, e n�o do interesse p�blico. Por outro lado, a opini�o de grande parte dos m�dicos � de que os conselhos atuam exatamente em sentido contr�rio.
 

Podemos estender as cr�ticas acima � maioria dos conselhos profissionais de classe (advogados, engenheiros, dentistas, etc.), E certamente, os mais prejudicados com a omiss�o das entidades � a pr�pria classe profissional a eles vinculada. Sobretudo, por permitir que incompetentes e criminosos atuem em meio aos bons profissionais, maculando publicamente a imagem de toda a classe. E quem ganha com isso? Somente os criminosos, que encontram em atividades como a m�dica a oportunidade perfeita para praticar seus crimes, em fun��o da submiss�o e confian�a depositadas pelos pacientes.

No recurso apresentado do STJ, o CRM alegou n�o lhe caber a exig�ncia atestado de sanidade f�sica e mental, para o exerc�cio da medicina. Ora, se de fato houvesse foco no interesse p�blico, no lugar de tal alega��o o CRM poderia propor ao CFM uma normativa que traga tal diretriz, pois a presen�a de psicopatas na medicina s� cresce. Al�m disso, no aludido caso bastaria uma simples pesquisa ou avalia��o dos registros pessoais e criminais do cidad�o, para atestar sua total contraindica��o � carreira m�dica. Pois falamos de uma pessoa com s�rios transtornos e um longo hist�rico de m� conduta, iniciado muito antes do ingresso na carreira m�dica e continuado no curso exerc�cio da profiss�o, sem que houvesse sua interdi��o, suspens�o ou cassa��o. 

Em sua defesa, o CRM alegou que qualquer provid�ncia de sua parte s� poderia existir mediante alguma den�ncia. Contudo, o objetivo dos conselhos � a fiscaliza��o do exerc�cio t�cnico e moral dos profissionais e elas vinculados (letra C, art. 15, Lei nº 3.268/57, que prev� as atribui��es dos Conselhos Regionais). N�o atender a este comando legalmente imposto � uma grave omiss�o, e configura claro ato de neglig�ncia. A decis�o proferida pelo STJ foi exatamente neste sentido, sendo sustentado pelo ministro relator que “um conselho profissional, entre outros interesses, busca a preval�ncia de profissionais registrados com condutas �ticas, apurando desvios e acompanhando aqueles (inclusive com assist�ncia e orienta��o) que j� se mostram tendentes a poss�veis excessos comportamentais.” Segundo a decis�o, a omiss�o do CRM foi determinante para que o abuso ocorresse, estando presente o nexo causal, e a obriga��o de indenizar a v�tima.
 

A condena��o do CRM neste caso traz � mem�ria diversos outros crimes absurdos, cometidos por psicopatas que nunca deveriam ter recebido o nobre t�tulo de m�dico. Na semana passada um pediatra foi preso por estupro no RJ, tendo pelo menos 14 den�ncias criminais anteriores, sendo 8 de mulheres. Em janeiro, um anestesista foi preso no RJ por estuprar diversas pacientes desacordadas, sendo apreendido em seu consult�rio vasto material de pedofilia. Menos de 1 ano antes, outro anestesista foi preso no RJ pelo estupro de uma paciente durante sua cesariana. Meses antes, um m�dico foi preso pela terceira vez em MG, acusado do abuso de mais de 100 crian�as e adolescentes. A lista � imensa, e a cada dia nos deparamos com mais casos de criminosos praticando a medicina, livremente. E podemos afirmar algo, sem sombra de d�vidas: antes de m�dicos, eles j� eram monstros. 

Por estes motivos, segundo o STJ que h� uma clara neglig�ncia dos conselhos em excluir de sua an�lise estes aspectos, antes de conceder a algu�m o t�tulo de m�dico. E esta omiss�o possibilitaria o exerc�cio da medicina, por pessoas que n�o re�nem condi��es sequer para viver em sociedade, mas que se qualificam a cuidar de pacientes que lhes confiam suas vidas, muitos em estado de grande fragilidade, e de total submiss�o e confian�a. Presas perfeitas, entregues nas garras dos predadores.   

A conduta sustentada pelos conselhos, conforme apontado pelo STJ, � um enorme desservi�o prestado � toda sociedade, que sofre com casos estarrecedores a cada semana. � toda a classe m�dica, que v� sua imagem maculada por criminosos que nunca deveriam ter feito o juramento de Hip�crates. Mas principalmente aos pacientes, que s�o v�timas de crimes b�rbaros, pelas m�os de quem lhes jurou cuidado, empatia e humanidade.  

A manuten��o da condena��o do CRM pelo STJ � um recado claro do Poder Judici�rio e da Sociedade Civil, a todos os Conselhos Profissionais de Classe. Um segundo passo neste sentido, pode ser a responsabiliza��o pessoal dos conselheiros, nas situa��es em que sejam comprovadamente omissos em rela��o �s suas atribui��es legais. 
 
Pois segundo Juscelino Kubitschek, que em 1957 sancionou a lei que rege a atua��o dos conselhos de medicina, “� in�til fechar os olhos � realidade. Se o fizermos, a realidade abrir� nossas p�lpebras e nos impor� a sua presen�a”.  


Renato Assis � advogado, especialista em Direito M�dico e Odontol�gico h� 15 anos, e conselheiro jur�dico e cient�fico da ANADEM. � fundador e CEO do escrit�rio que leva seu nome, sediado em Belo Horizonte/MG e atuante em todo o pa�s.    
 

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