
Ao menos 95 mil vidas poderiam ter sido salvas, segundo c�lculos conservadores do epidemiologista Pedro Hallal, da Universidade Federal de Pelotas (RS). Ou seja, os n�meros podem ser maiores, mas essas doses de vacinas poderiam evitar no m�nimo 1 em cada 5 mortes, se considerarmos que 496 mil pessoas morreram oficialmente de covid-19 no Brasil at� o fim de maio de 2021.
Para chegar a esse n�mero, Hallal explica � BBC News Brasil ter se baseado em dados epidemiol�gicos da pandemia e em dois depoimentos cruciais para a investiga��o no Senado sobre a condu��o da pandemia pelo governo Bolsonaro.
O primeiro foi prestado pelo gerente-geral da farmac�utica Pfizer na Am�rica Latina, Carlos Murillo, em 13/05. Segundo ele, o governo Bolsonaro rejeitou tr�s ofertas de 70 milh�es de doses da vacina Pfizer/BioNTech, cujas primeiras doses poderiam ter sido entregues em dezembro de 2020.
Na pr�tica, o acordo com a farmac�utica, se tivesse sido fechado quando foi proposto, teria garantido ao Brasil 4,5 milh�es de doses de vacina at� o fim de mar�o de 2021. A primeira oferta de vacinas foi feita em agosto de 2020, mas o governo Bolsonaro s� fechou a compra delas em mar�o de 2021.
O segundo depoimento usado no c�lculo foi prestado pelo diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, na quinta-feira (27/05). Segundo ele, o governo Bolsonaro rejeitou tr�s ofertas de compra da Coronavac, sendo que uma delas teria garantido 60 milh�es de doses da vacina, mesmo que a Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa) n�o tivesse autorizado ainda o uso desse imunizante.

Covas afirmou � CPI que a primeira oferta foi feita em julho de 2020, mas o governo Bolsonaro s� acertou a compra em janeiro de 2021. Se tivesse comprado no momento da primeira oferta, o pa�s teria 49 milh�es de doses a mais do que tem hoje.
Dessa forma, se o pa�s tivesse comprado as vacinas quando elas foram ofertadas pela primeira vez, teria hoje 50% a mais do que tem. Ou seja, quase 150 milh�es em vez das 100 milh�es atuais. Isso seria suficiente para vacinar praticamente todos os brasileiros dos grupos priorit�rios, que somam quase 80 milh�es de pessoas. O Minist�rio da Sa�de estima atualmente que a vacina��o dessa parcela da popula��o s� seja conclu�da em setembro ou outubro.
O c�lculo de Hallal leva em conta algumas vari�veis, como a efic�cia das vacinas, a quantidade de pessoas suscet�veis ao v�rus e a taxa de letalidade estimada de covid-19 (que varia de uma faixa et�ria para outra).
Primeiro, a efic�cia global das vacinas (94% para a Pfizer e 50% para a Coronavac). Esses dados correspondam � quantidade de pessoas vacinadas que n�o ficam doente ap�s serem imunizadas, e n�o ao n�mero de vacinados que n�o morrem (80%, no caso da Coronavac, segundo estudo do governo do Chile).
Ainda assim, Hallal optou neste momento por ser mais conservador em seu c�lculo, mas afirmou que se aprofundasse a an�lise, o n�mero de vidas salvas seria maior.
Segundo, Hallal considerou para seu c�lculo, novamente sendo conservador, a taxa de letalidade de 1%, que � a estimada para a popula��o em geral. Mas sabe-se que esse n�mero � muito mais alto entre os idosos, que foram os primeiros a serem vacinados. Dados da Universidade Federal do Amazonas apontam uma letalidade entre 20% e 40% dos idosos com mais de 80 anos que acabaram infectados por covid-19.
Como resultado, calcula o epidemiologista, poderiam ter sido evitadas pelo menos 14 mil mortes com as 4,5 milh�es de doses da Pfizer e 80.300 mortes com as 49 milh�es de doses da Coronavac.
O pesquisador ainda avalia se far� c�lculos mais precisos num artigo cient�fico mais formal, que "certamente dar�o n�meros ainda maiores", sobre as vidas que poderiam ter sido salvas com a compra das vacinas.
Por que o governo Bolsonaro n�o comprou as vacinas quando elas foram ofertadas?
As raz�es que levaram o governo Bolsonaro a rejeitar as ofertas de vacinas em 2020 n�o est�o totalmente claras, mas algumas delas foram apontadas tamb�m pelo ex-ministro da Sa�de, Eduardo Pazuello, em seu depoimento � CPI da Covid.
Sobre a vacina da Pfizer, o general citou alguns obst�culos para assinar o contrato. Um deles era o pre�o de US$ 10 (cerca de R$ 50) por dose, mais alto que outro imunizante negociado pelo governo federal com a farmac�utica AstraZeneca (US$ 3,50 ou cerca de R$ 18). O valor de US$ 10 acabaria sendo aceito pelo governo Bolsonaro sete meses depois.
Outros empecilhos, segundo Pazuello, eram a quantidade pequena de vacinas, a n�o transfer�ncia de tecnologia para o pa�s (presente nos contratos com a AstraZeneca e com a Sinovac) e "cl�usulas assustadoras" e "leoninas" no contrato com a Pfizer.
Uma delas era a exig�ncia de isen��o de responsabilidade da farmac�utica sobre eventuais efeitos colaterais. Segundo a Pfizer, os termos contratuais eram padronizados e foram aceitos pelos demais pa�ses do mundo que adquiriram, antes mesmo do Brasil, as vacinas da empresa.
No caso da vacina Coronavac, produzida em parceria entre o Instituto Butantan e a farmac�utica chinesa Sinovac, Dimas Covas afirmou que depois de meses de negocia��o e insist�ncia, um documento de compromisso de compra chegou a ser acertado entre o Butantan e o governo federal em outubro, mas o presidente Jair Bolsonaro "mandou cancelar" o contrato e o compromisso "ficou em suspenso".
Segundo o diretor do Butantan, n�o houve nenhum questionamento formal do Minist�rio da Sa�de sobre poss�veis d�vidas em rela��o � vacina. E, com a suspens�o do acerto, o Butantan passou a enfrentar incertezas sobre o financiamento de sua produ��o.
Al�m disso, Covas afirma que a demora fez com que parceiros internacionais de fornecimento de mat�ria-prima de vacina fechassem contratos com outros fabricantes. Isso levou a uma disponibilidade muito menor de doses quando o governo Bolsonaro decidiu finalmente fechar contrato com o Butantan, seis meses depois.
Pelo menos dois fatores influenciaram a decis�o de Bolsonaro de n�o fechar contrato com o Butantan. Primeiro, diverg�ncias com o governador de S�o Paulo, Jo�o Doria (PSDB), visto por Bolsonaro como seu virtual concorrente na disputa pelo Pal�cio do Planalto em 2022. O Butantan � ligado ao governo paulista.
Segundo, a press�o de militantes de direita que, a partir do momento em que Pazuello anunciou a compra da Coronavac, passaram a circular em grupos de WhatsApp de apoiadores do governo teorias conspirat�rias contra a vacina desenvolvida pela chinesa Sinovac. Termos como "VaChina" e "Fraudemia" s�o empregados com frequ�ncia nestas correntes.
Em entrevista � r�dio Jovem Pan em outubro de 2020, Bolsonaro disse que o governo federal n�o compraria nenhuma vacina oriunda da China, mesmo que ela fosse aprovada pela Anvisa.
"Da China n�s n�o compraremos. � decis�o minha. Eu n�o acredito que ela transmita seguran�a suficiente para a popula��o pela sua origem. Esse � o pensamento nosso", disse Bolsonaro, que acabaria fechando o contrato em janeiro de 2021.
At� o fim de abril, quase 80% das vacinas aplicadas no Brasil eram a Coronavac.
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A COVID-19 � uma doen�a provocada pelo v�rus Sars-CoV2, com os primeiros casos registrados na China no fim de 2019, mas identificada como um novo tipo de coronav�rus pela Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS) em janeiro de 2020. Em 11 de mar�o de 2020, a OMS declarou a COVID-19 como pandemia.