Paloma Oliveto - Correio Braziliense

Embora seja um problema complexo, a f�rmula da obesidade � relativamente simples: o ganho de gordura acontece quando a ingest�o de energia excede o gasto cal�rico. Esse montante a mais, que o organismo n�o necessita para dar conta das tarefas di�rias, � armazenado no tecido adiposo branco ou dissipado pelo marrom. Agora, um estudo norte-americano e canadense publicado na revista Science mostra que comer na fase ativa do ciclo circadiano - popularmente chamado de rel�gio biol�gico - ajuda na queima das calorias para produ��o de calor, um processo chamado termog�nese.
De acordo com os autores, das universidades de Northwestern, nos Estados Unidos, e de McGill, no Canad�, a descoberta pode ajudar no combate � obesidade, problema que afeta mais de 1 bilh�o de adultos, adolescentes e crian�as, segundo a Organiza��o Mundial da Sa�de (OMS). O ac�mulo de gordura prejudica todos os sistemas do organismo e � fator de risco para doen�as debilitantes, como diabetes 2, acidentes vasculares e diversos tipos de c�ncer.
Estudos anteriores j� haviam demonstrado que a hora de comer impacta no gasto ou ganho de gordura. Segundo pesquisas, ingerir calorias na fase ativa do ciclo circadiano - o dia - ajuda na dissipa��o das calorias. J� o h�bito de se alimentar na fase de repouso est� associado a um risco aumentado de obesidade. Contudo, os mecanismos envolvidos nessa din�mica n�o s�o bem entendidos.
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Para ajudar a compreend�-los, os pesquisadores, liderados pela endocrinologista Chelsea Hepler, da Universidade de Northwestern, avaliaram o efeito de uma abordagem conhecida como alimenta��o com restri��o de tempo (TRE) em camundongos que ingeriram dietas ricas em gordura, uma forma de estimular a obesidade nesses animais. A TRE � um tipo de jejum intermitente que se baseia no ciclo circadiano - a ideia � comer apenas durante o dia e evitar se alimentar � noite. No caso dos ratos, acontece o contr�rio, pois o per�odo ativo deles � o noturno.
Metabolismo
"Dentro de uma semana de exposi��o a uma dieta rica em gordura fornecida exclusivamente durante o per�odo inativo, os camundongos exibiram aumento de peso em compara��o com os animais que receberam a mesma dieta no per�odo ativo", afirmam os autores, no artigo. Os pesquisadores, ent�o, realizaram uma s�rie de testes metab�licos, incluindo colocar os roedores na situa��o de termoneutralidade, definido como a temperatura na qual eles gastam o m�nimo de energia para manter a temperatura corporal.
Com os testes, os cientistas descobriram que restringir a alimenta��o apenas para o per�odo ativo fez com que a queima das c�lulas adiposas se aprimorasse, tornando a termog�nese mais eficiente. Consequentemente, eles emagreceram, mesmo consumindo a mesma dieta gordurosa que os animais do grupo de controle.
Segundo os autores, nos camundongos, que s�o ativos � noite, a exposi��o � luz perturbou o ritmo circadiano, o que se traduziu, na pr�tica, em menor queima de gordura e, consequentemente, obesidade. Em humanos, que t�m um ciclo contr�rio, a falta de luminosidade � que seria o gatilho para deixar a termog�nese menos eficiente, contribuindo para o ganho de peso no caso da alimenta��o no per�odo de repouso.
"Esse trabalho expande nosso conhecimento sobre os mecanismos subjacentes aos benef�cios da alimenta��o com restri��o de tempo (TRE)", avalia Damien Lagarde, bioqu�mico da Universidade de McGill que n�o participou do estudo. "A TRE, em humanos, parece ser uma abordagem promissora para diminuir o peso corporal e melhorar a sa�de metab�lica, com poucos efeitos adversos", opina.
As descobertas do estudo v�o ao encontro de pesquisas publicadas recentemente, que tamb�m verificaram, em humanos, uma redu��o de peso com a ado��o da abordagem de jejum intermitente TRE. No m�s passado, um artigo divulgado no Jama Internal Medicine mostrou que, em duas semanas, adultos obesos que se alimentavam apenas entre 7h e 15h perderam mais peso (6,3kg) do que aqueles que consumiram uma dieta similar, distribu�da por um per�odo extenso (4kg).
"A TRE � uma interven��o excepcionalmente simples e pr�tica. Os estudos mostram que ela pode contribuir para a perda de peso em curto prazo, se combinada com restri��o cal�rica. Outros 21 estudos anteriores forneceram resultados mistos, mas, em geral, tamb�m encorajadores", observa Peter Hajek, do Instituto de Sa�de Populacional da Queen Mary University of London, na Inglaterra. "No entanto, uma s�rie de outras interven��es podem gerar perda de peso em curto prazo. O desafio �, invariavelmente, saber se os benef�cios podem ser sustentados. Por isso, � necess�rio, agora, um estudo sobre os efeitos da TRE com acompanhamento de longo prazo."
Neur�nios "gulosos"
Pesquisadores do Laborat�rio de Cold Spring Harbor, nos Estados Unidos, descobriram que uma �rea do c�rebro chamada am�gdala pode ser a culpada por se comer alimentos n�o saud�veis, a chamada junk food. O cientista Bo Li detectou um grupo de neur�nios nessa regi�o que leva camundongos a escolher produtos gordurosos ou a�ucarados, mesmo quando n�o est�o com fome. Segundo ele, abordagens direcionadas a essas c�lulas podem levar a novos tratamentos para obesidade, com efeitos colaterais m�nimos.
Como a maioria das pessoas, os ratos tamb�m tendem a achar os alimentos ricos em gordura e a��car os mais saborosos. Eles podem se entregar a essas guloseimas por prazer, e n�o por sobreviv�ncia.
Os neur�nios que Li estudou desencadeiam esse comportamento, chamado de alimenta��o hed�nica. "Mesmo que o animal deva parar de comer porque j� est� cheio, se esses neur�nios ainda estiverem ativos, isso ainda pode levar esses animais a comer mais", destacou Li, em um comunicado de imprensa.
Efeitos colaterais
A preocupa��o do pesquisador � que poucas pessoas que tratam obesidade conseguem controlar o peso em longo prazo, pois os processos metab�licos no organismo geralmente revertem qualquer progresso feito. Tratamentos dispon�veis podem ajudar a aumentar as chances de sucesso, mas muitos medicamentos t�m efeitos colaterais indesejados ou t�m pre�os pouco acess�veis. "Portanto, � necess�ria uma abordagem mais direcionada", disse Li. "Identificar o circuito cerebral que controla a alimenta��o � importante para desenvolver melhores op��es para pessoas que lutam para controlar seu peso".
Quando a equipe desligou os neur�nios espec�ficos, os camundongos n�o foram atra�dos pelos alimentos gordurosos e a�ucarados que os haviam tentado antes. "Eles apenas comeram alegremente e permaneceram saud�veis", contou Li. "Eles n�o apenas pararam de ganhar peso, mas tamb�m pareciam muito mais saud�veis em geral". Desativar essas c�lulas reduziu os excessos e protegeu os animais contra a obesidade. Tamb�m impulsionou a atividade f�sica, levando � perda de peso e melhor sa�de metab�lica.
Li est� explorando maneiras de manipular os neur�nios que desencadeiam a alimenta��o hed�nica. O pr�ximo passo, informou ele, � mapear como essas c�lulas respondem a diferentes tipos de alimentos e ver o que as torna t�o sens�veis � junk food. Ele espera que, assim, surjam novas estrat�gias para terapias anti-obesidade eficazes.