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Hansen�ase, mal�ria, tuberculose: pandemia reduz combate a doen�as que afetam os mais pobres

O pesquisador Jadel Kratz, especialista em doen�as negligenciadas, explica a prec�rio cen�rio de enfermidades como Chagas, hansen�ase e leishmaniose em meio � emerg�ncia de sa�de p�blica gerada pela covid-19.


08/04/2021 09:39 - atualizado 08/04/2021 10:38

Dengue, doença de Chagas, leishmaniose, hanseníase, malária, esquistossomose e tuberculose são consideradas doenças negligenciadas(foto: Getty Images)
Dengue, doen�a de Chagas, leishmaniose, hansen�ase, mal�ria, esquistossomose e tuberculose s�o consideradas doen�as negligenciadas (foto: Getty Images)


Hansen�ase, esquistossomose, doen�a de Chagas, leishmaniose, mal�ria, hepatites, filariose linf�tica... a lista � grande.

Com a emerg�ncia de sa�de p�blica criada pela covid-19, o combate a doen�as que mesmo antes da pandemia j� recebiam pouca aten��o piorou dramaticamente. Estas enfermidades costumam ser classificadas pela comunidade cient�fica como "doen�as negligenciadas".

O termo se refere a doen�as infecciosas que atingem um grande n�mero de pessoas e afetam principalmente as popula��es mais pobres.

Segundo a Organiza��o Mundial de Sa�de, as chamadas doen�as negligenciadas podem afetar at� 1,6 bilh�o de pessoas em todo o mundo. Elas est�o principalmente na �sia, na �frica e na Am�rica Latina.

Mesmo antes da pandemia, elas j� recebiam poucos investimentos da ind�stria farmac�utica porque, para muitos especialistas, tanto os rem�dios quanto os tratamentos renderiam pouco lucro a laborat�rios.

Esta � a vis�o de Jadel Kratz, um especialista em doen�as negligenciadas que chefia a �rea de Pesquisa e Desenvolvimento da DNDI (Iniciativa Medicamentos para Doen�as Negligenciadas), uma entidade sem fins lucrativos que defende o combate a essas enfermidades.

Enquanto o mundo concentra esfor�os no combate � covid-19, pesquisas e estudos cl�nicos sobre as doen�as negligenciadas foram interrompidos. E faltam rem�dios para pacientes, afirma Kratz em entrevista � BBC News Brasil.

"Doen�as que estavam muito pr�ximas de serem controladas, ou erradicadas, ou de atingirem os objetivos de combate da OMS talvez tenham retrocessos", diz o pesquisador.

Ele alerta que iniciativas importantes para o diagn�stico destas doen�as em diversas universidades foram paralisadas com a pandemia. E aponta que elas s�o essenciais, j� que muitas das pessoas afetadas n�o t�m acesso ao sistema de sa�de e, no fim das contas, podem nem saber que est�o doentes.

As consequ�ncias podem ser graves, incluindo o risco de gerarem comorbidades que tornem as infec��es por covid-19 ainda mais graves, explica Kratz.

"S�o doen�as que t�m problemas de resist�ncia a medicamentos. Ent�o, se o paciente interromper o tratamento, aquele mesmo tratamento talvez j� n�o seja eficaz l� na frente."

Para Kratz, este cen�rio torna ainda mais importante o controle da epidemia de covid-19 o mais r�pido poss�vel.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista de Kratz � BBC News Brasil.


A hanseníase é uma das doenças que podem debilitar as pessoas afetadas para o resto da vida(foto: Getty Images)
A hansen�ase � uma das doen�as que podem debilitar as pessoas afetadas para o resto da vida (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - Por que pesquisas em universidades e institui��es p�blicas s�o importantes para doen�as negligenciadas?

Jadel Kratz - A pesquisa acad�mica � importante em todas as �reas das ci�ncias da vida. Muitas das inova��es m�dicas e farmac�uticas come�am com a ci�ncia b�sica. Mas, mais ainda onde o modelo tradicional farmac�utico n�o est�. Uma vez que a ind�stria tem pouco interesse nessa �rea, por uma s�rie de raz�es, uma delas o lucro, as institui��es p�blicas que t�m essa miss�o assumem um papel ainda mais central.

� o caso da Fiocruz, que foi criada pensando nisso, e de fato � um dos centros de pesquisa mais relevantes para essas doen�as no Brasil.

BBC News Brasil - Como a pandemia afetou esse cen�rio no �ltimo ano?

Kratz - A real magnitude do impacto disso ainda est� sendo acessado. Historicamente, as doen�as tropicais negligenciadas, por exemplo Chagas, leishmaniose, tuberculose, hansen�ase, j� vem de um hist�rico de pouco investimento. O investimento � baixo, mas � relativamente est�vel. Sendo criativo, fazendo-se novos modelos, �s vezes a gente consegue avan�ar.

Mas, quando surgiu uma emerg�ncia m�dica do n�vel da covid-19, boa parte dos investimentos foi sugada. Os investimentos j� eram escassos e deixaram de estar dispon�veis para essas doen�as. A prioridade do financiamento para pesquisas em doen�as negligenciadas caiu, foi para outra �rea. E talvez os n�meros gerais de investimentos sejam menores no final porque talvez o mundo entre em crise. O dinheiro vai diminuir, apesar de todo mundo reconhecer agora que � importante fazer pesquisa biom�dica.

Al�m da diminui��o dos investimentos, as pr�prias condi��es para os estudos foram dificultadas. Os estudos cl�nicos normalmente s�o feitos em ambiente hospitalar e muito descentralizados. Os estudos cl�nicos para outras enfermidades pararam. Ou porque o hospital est� completamente lotado e precisa redirecionar todos os recursos para o atendimento emergencial ou porque ele foi fazer um estudo cl�nico para a covid-19. Tem levantamentos nos EUA que mostram que reduziu por volta de 80% o n�mero de estudos cl�nicos rodando..

Foram todos substitu�dos por estudos para covid-19 — v�rios deles mal desenhados, feitos na correria.

Nossos laborat�rios que desenvolvem novos medicamentos para Chagas e Leishmaniose tiveram que ficar por v�rios meses fechados na Unicamp. A gente tem projetos com parceiros na Unicamp, na USP, na UFRJ e muitos desses laborat�rios tiveram que fechar. Desde o n�vel mais b�sico, para entender como aquele parasita afeta o corpo, at� os estudos cl�nicos sendo feitos no ambiente hospitalar.

Vai atrasar ainda mais as pesquisas que j� est�o historicamente atrasadas.


A maior parte dessas doenças atingem majoritariamente crianças e deixam sequelas físicas, sociais e econômicas para o resto da vida(foto: Getty Images)
A maior parte dessas doen�as atingem majoritariamente crian�as e deixam sequelas f�sicas, sociais e econ�micas para o resto da vida (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - E a produ��o de rem�dios para essas doen�as?

Kratz - Um ponto importante � a interrup��o das cadeias, tanto de estudo quanto de suprimentos. Ent�o, n�o s� as pesquisas est�o paradas, como faltam medicamentos.

Muitas das doen�as tropicais n�o t�m uma maquinaria bem azeitada de produ��o. Um exemplo cl�ssico � a hansen�ase: as medica��es s�o antigas, n�o s�o ideais, t�m uma s�rie de efeitos colaterais negativos. Mas � importante que os pacientes tenham acesso a essas medica��es, mesmo que elas sejam imperfeitas.

Elas normalmente s�o baratas, antigas, n�o t�m um incentivo de neg�cio para a produ��o. Muitas vezes, as ind�strias que ainda fazem a produ��o desses medicamentos doam ou vendem a pre�os super baratos para o sistema de sa�de. Muitas pararam de produzir esses medicamentos porque foram produzir coisas mais urgentes. Ent�o, as cadeias foram interrompidas e os pacientes ficaram sem (rem�dios), como no caso da hansen�ase.

BBC News Brasil - Quando as coisas voltarem ao normal, ser� poss�vel recuperar esses projetos de onde pararam? Ou perde-se parte do que j� tinha sido feito e � preciso come�ar tudo de novo?

Kratz - A cadeia foi muito abalada e a gente n�o sabe quando isso vai retornar. Em estudos cl�nicos de campo foram interrompidos, aquilo se perdeu. Al�m disso, h� lacunas: a ci�ncia � feita por pessoas e elas passam por uma forma��o para chegar l�. Com a pandemia, vai ter muita lacuna de pessoal, de cientistas sendo formados. Gente que teve que postergar seu mestrado, suas pesquisas, sobretudo cientistas de in�cio de carreira.

As doen�as tropicais negligenciadas t�m um plano bastante estruturado de pesquisa, que � o roadmap (mapa de projetos futuros) da Organiza��o Mundial da Sa�de de controle e elimina��o de doen�as.

Isso envolve m�ltiplas estrat�gias, muitas delas de campo. Controle de vetores, melhora de infraestrutura, administra��o de medicamentos, diagn�stico, monitoramento de pacientes. E muitas vezes, especialmente no caso das doen�as negligenciadas, isso � feito na Unidade B�sica de Sa�de (UBS). Agora a UBS est� maluca controlando covid-19, n�o consegue fazer mais nada. Doen�as que estavam muito pr�ximas de serem controladas, erradicadas, ou de atingirem os objetivos de combate da OMS, talvez tenham retrocessos. Doen�as como tuberculose, mal�ria, Chagas, leishmaniose que t�m problemas s�rios de subnotifica��o e diagn�sticos, pioraram ainda mais, n�o h� d�vida. Doen�as como tuberculose, que mata na escala de milh�o de pessoas por ano, foram largadas ao ostracismo pela urg�ncia da pandemia.

BBC News Brasil - Ent�o o atendimento aos pacientes tamb�m foi afetado?

Kratz - Al�m do impacto nas pesquisas voc� teve o impacto nas estrat�gias j� implementadas de combate e controle. Sobretudo essas iniciativas grandes de diagn�sticos, achar os pacientes e trat�-los. E s�o doen�as que t�m problemas de resist�ncia � medicamentos. Se o paciente interrompe o tratamento no meio, aquele mesmo tratamento talvez j� n�o seja eficaz l� na frente. O impacto � claro, s� n�o est� mensurado ainda.

A gente pode pegar o exemplo cl�ssico da doen�a da Chagas, que � uma doen�a parasit�ria negligenciada que afeta principalmente regi�es pobres e com pouca infraestrutura no mundo. Muitas das pessoas moram em �reas end�micas, rurais, t�m baixa escolaridade, problemas associados � pobreza, n�o t�m acesso ao sistema de sa�de e acabam n�o diagnosticadas. O resultado disso � que o n�mero de pessoas que � de fato diagnosticado � baixo, mas a gente estima que haja 6 milh�es de pessoas com a doen�a no mundo. Nas regi�es end�micas, h� mais de 70 milh�es de pessoas em risco. E no fim, menos de 1% das pessoas que t�m Chagas acessam o tratamento. A lacuna do diagn�stico e tratamento � preenchida por grandes esfor�os: ter pessoas no campo, com kits de testagem adaptados, baratos, e com tratamento seguro e barato. E a pandemia afetou isso, n�o s� para Chagas, mas para outras doen�as.

E essas pessoas que deixam de ser diagnosticadas e tratadas continuam sendo reservat�rios da doen�a, o que pode contribuir para que outras pessoas se infectem, atrav�s dos vetores (no caso de Chagas, o barbeiro). N�o tratadas e n�o diagnosticadas, as pessoas podem desenvolver as formas mais graves e morrerem. E se infectadas por covid podem ter um agravamento do quadro por causa de comorbidades.


São doenças que têm a transmissão facilitada por condições ambientais, como umidade(foto: Getty Images)
S�o doen�as que t�m a transmiss�o facilitada por condi��es ambientais, como umidade (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - Falando em comorbidade, como as pessoas com essas doen�as s�o afetadas pela covid?

Kratz - � dif�cil falar em n�meros, mas eu n�o tenho d�vidas que o que est� sendo feito para analisar a quest�o da comorbidade � insuficiente justamente pela quest�o de que a gente mal est� conseguindo controlar a pandemia. A doen�a de Chagas, por exemplo, tem uma liga��o super clara de comorbidade. Normalmente o paciente se infecta, tem um quadro agudo, com pouca mortalidade nesse est�gio — muitos dos pacientes nem percebem que pegaram. E depois aquilo cronifica, reduz a carga parasit�ria e uma parte desses pacientes, cerca de 20%, 30% v�o ter problemas card�acos associados ao trypanosoma cruzi. E o paciente pode nem saber que tem comorbidade, e a� pega covid e acaba tendo um quadro mais grave.

A covid n�o enxerga classes, mas se a comunidade mais pobre tem mais Chagas, ent�o ela est� propensa a ter quadros mais vulner�veis e casos mais graves de covid associados � comorbidade.

A covid � uma doen�a infecciosa que tem um componente forte do sistema imunol�gico no agravamento dos casos. A gente sabe que muitos dos casos graves n�o � a doen�a em si que agrava a situa��o da pessoa, mas a rea��o do sistema imunol�gico. Ent�o a pessoa ter um sistema imunol�gico funcionando plenamente ajuda que a doen�a n�o se agrave. E muitas das doen�as negligenciadas tamb�m afetam o sistema imune, como a leishmaniose.


As doenças negligenciadas se concentram em áreas pobres, como favelas urbanas e zonas rurais remotas(foto: Getty Images)
As doen�as negligenciadas se concentram em �reas pobres, como favelas urbanas e zonas rurais remotas (foto: Getty Images)

BBC News Brasil - Tem alguma li��o que a pandemia pode trazer sobre a forma como fazemos ci�ncia que pode ajudar no combate �s doen�as negligenciadas no futuro?

Kratz - Essa pandemia mostrou o quanto � importante a pesquisa colaborativa, interdisciplinar e integrada. Ou seja, o qu�o importante � a colabora��o, que se manifesta atrav�s de ci�ncia aberta, compartilhamento de dados, financiamentos coletivos em vez daquele modelo fechado, pensando s� no lucro. A gente teve oportunidade de validar novas plataformas, como as vacinas de RNA. Se a gente pensar que o v�rus foi sequenciado em janeiro do ano passado e no final do ano a gente estava fazendo ensaio cl�nico de fase 3 (a fase mais avan�ada antes da libera��o para o p�blico), tudo isso em um ano... Isso vem para dar uma chacoalhada: sim, � poss�vel fazer mais r�pido, com qualidade, quando tem prioridade, financiamento e colabora��o.


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O que � um lockdown?

Saiba como funciona essa medida extrema, as diferen�as entre quarentena, distanciamento social e lockdown, e porque as medidas de restri��o de circula��o de pessoas adotadas no Brasil n�o podem ser chamadas de lockdown.


Vacinas contra COVID-19 usadas no Brasil

  • Oxford/Astrazeneca

Produzida pelo grupo brit�nico AstraZeneca, em parceria com a Universidade de Oxford, a vacina recebeu registro definitivo para uso no Brasil pela Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa). No pa�s ela � produzida pela Funda��o Oswaldo Cruz (Fiocruz).

  • CoronaVac/Butantan

Em 17 de janeiro, a vacina desenvolvida pela farmac�utica chinesa Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan no Brasil, recebeu a libera��o de uso emergencial pela Anvisa.

  • Janssen

A Anvisa aprovou por unanimidade o uso emergencial no Brasil da vacina da Janssen, subsidi�ria da Johnson & Johnson, contra a COVID-19. Trata-se do �nico no mercado que garante a prote��o em uma s� dose, o que pode acelerar a imuniza��o. A Santa Casa de Belo Horizonte participou dos testes na fase 3 da vacina da Janssen.

  • Pfizer

A vacina da Pfizer foi rejeitada pelo Minist�rio da Sa�de em 2020 e ironizada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas foi a primeira a receber autoriza��o para uso amplo pela Anvisa, em 23/02.

Minas Gerais tem 10 vacinas em pesquisa nas universidades

Como funciona o 'passaporte de vacina��o'?

Os chamados passaportes de vacina��o contra COVID-19 j� est�o em funcionamento em algumas regi�es do mundo e em estudo em v�rios pa�ses. Sistema de controel tem como objetivo garantir tr�nsito de pessoas imunizadas e fomentar turismo e economia. Especialistas dizem que os passaportes de vacina��o imp�em desafios �ticos e cient�ficos.


Quais os sintomas do coronav�rus?

Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:

  • Febre
  • Tosse
  • Falta de ar e dificuldade para respirar
  • Problemas g�stricos
  • Diarreia

Em casos graves, as v�timas apresentam

  • Pneumonia
  • S�ndrome respirat�ria aguda severa
  • Insufici�ncia renal

Os tipos de sintomas para COVID-19 aumentam a cada semana conforme os pesquisadores avan�am na identifica��o do comportamento do v�rus.

 

 

Entenda as regras de prote��o contra as novas cepas



 

Mitos e verdades sobre o v�rus

Nas redes sociais, a propaga��o da COVID-19 espalhou tamb�m boatos sobre como o v�rus Sars-CoV-2 ï¿½ transmitido. E outras d�vidas foram surgindo: O �lcool em gel � capaz de matar o v�rus? O coronav�rus � letal em um n�vel preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar v�rias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS n�o teria condi��es de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um m�dico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronav�rus.


Para saber mais sobre o coronav�rus, leia tamb�m:


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